O Tanoeiro da Ribeira

terça-feira, janeiro 29, 2019

UM MINUTO COM DEUS



Faz agora dois meses. Rodeada de amigos, ali repousa, no seu leito de morte, aquela menina que eu conhecera quando, em 1962 e 1963, aluno do Seminário Maior do Porto, colaborei na realização de “colónias de férias” para meninos do “Bairro da Sé”, na escola do Calvário – onde, em 1966, a “Obra dos Bairros” organizou colónia idêntica mas para crianças do Cerco do Porto. Muitas raparigas de Valongo vinham colaborar nas lides domésticas: faziam as camas; varriam as camaratas; serviam à mesa; lavavam a louça; ajudavam na cozinha. Também apareciam rapazes para jogar futebol com a pequenada e a ajudar à Missa - que ainda era em latim - na capela do Calvário. A Ana Teresa e suas irmãs mais novas, além de apoiarem nas tarefas diárias, começaram a trazer produtos agrícolas que seus pais cultivavam: batatas, cebolas, frutas, hortaliças. Por vezes, era o pai – que foi condiscípulo de D. Florentino - que as trazia com a mala do carro bem recheada….E que jeito nos fazia! Éramos estudantes e nunca pedimos um tostão ao Seminário para as colónias que realizámos, a primeira das quais foi em Albergaria das Cabras. Valiam-nos as ofertas de instituições do Porto e as ajudas de gente generosa… E nunca faltou nada aos meninos. Também não exigiam muito. Sentiam-se amados. Tínhamos aprendido com o “Pai Américo” a privilegiar o essencial… Outros tempos! Se fosse hoje…

 Assim nasceu um conhecimento que frutificou em amizade. Com seis filhos, era uma família que me habituei a admirar. Nas férias, visitava-os em sua casa onde, muitas vezes, pernoitei. Sua mãe, que sempre tratei por D. Arina, hoje com 103 anos, acolhia-me com todo o carinho. É bem verdade que a família é o nosso primeiro e mais fundamental «banco de dados”, raiz e matriz da nossa “estátua interior”.

Mais tarde, a Ana Teresa veio a casar com um jovem que era meu amigo, desde a sua adolescência. Estive no seu casamento. A vida continuou. E os encontros tornaram-se esporádicos: na Casa da Música; na igreja das Antas; em concertos do Coro Gregoriano do Porto, na apresentação de livros. Compensávamos esta ausência com os “emails” que trocávamos. O último, que dá título a este texto, deixa-nos duas questões:

“Como podemos nós esquecer-nos de Jesus? Acreditamos em tudo o que nos ensinam, mas sempre questionamos as coisas que vêm de Deus! Todos queremos um dia estar com Ele, mas não nos esforçamos por O dar a conhecer! As pessoas mandam piadas por e-mail e passam-nas para outras à velocidade da luz. Mas quando a mensagem é de Deus, pensam duas vezes antes de a partilhar. Tentam ser invisíveis se se trata de Jesus Cristo! Por quê?”

Ana Teresa, no “Minuto com Deus” que pedias, vou refletir sobre as tuas perguntas derradeiras. Que Deus te recompense pelo bem que fizeste a quantos contigo se encontraram nos caminhos da vida.

(30/1/2019)

 

quarta-feira, janeiro 23, 2019

NO DEALBAR DE NOVO ANO


Esta reflexão tem por base a homilia que ouvi numa igreja do Porto, em “Dia de Todos os Santos”. O celebrante apresentou o versículo “Alegrai-vos e exultai” do Evangelho como síntese da Liturgia da Palavra. Depois de informar que este foi o título que o Papa Francisco escolheu para a Exortação Apostólica “sobre o chamamento à santidade no mundo atual”, explicitou algumas das suas ideias mestras.

Logo na Introdução, o Santo Padre faz-nos um apelo: “ O Senhor pede tudo e, em troca, oferece a vida verdadeira, a felicidade para a qual fomos criados. Quer-nos santos e espera que não nos resignemos com uma vida medíocre, superficial e indecisa”. E esclarece: “O meu objetivo é humilde; fazer ressoar mais uma vez o chamamento à santidade, procurando encarná-lo no contexto atual, com os seus riscos, desafios e oportunidades”. 

A concretizar esta intenção, o celebrante invocou o capítulo que fala de «Os santos ao pé da porta»: “Gosto de ver a santidade no povo de Deus: nos pais que criam os seus filhos com tanto amor; nos homens e mulheres que trabalham a fim de trazer o pão para casa; nos doentes; nas consagradas idosas que continuam a sorrir. Nesta constância de continuar a caminhar dia após dia, vejo a santidade da Igreja militante. Esta é muitas vezes a santidade «ao pé da porta», daqueles que vivem perto de nós e são um reflexo da presença de Deus ou – por outras palavras – da «classe média da santidade».

A este propósito, invocou o pensamento de Sophia de Mello Breyner Andresen: “A poesia é oferecida a cada pessoa só uma vez e o efeito da negação é irreversível. O amor é oferecido raramente e aquele que o nega algumas vezes depois não o encontra mais. Mas a santidade é oferecida a cada pessoa de novo cada dia, e por isso aqueles que renunciam à santidade são obrigados a repetir a negação todos os dias.”

Lembrei-me, então, dum texto de Maria de Lourdes Belchior:
«Hoje é dia de todos os santos: dos que têm auréola e dos que não foram canonizados. Santos barbeiros e santos cozinheiros, e porque não? mercadores, caldeireiros e arrumadores”.

No capítulo «À Luz do Mestre», o Santo Padre indica-nos caminhos: “Ser pobre no coração”; ”Reagir com humilde mansidão”; “Saber chorar com os outros”; “Buscar a justiça com fome e sede”; “Olhar e agir com misericórdia”; “Manter o coração limpo de tudo o que mancha o amor”; “Semear a paz ao nosso redor”; “Abraçar diariamente o caminho do Evangelho mesmo que nos acarrete problemas” – “ISTO É SANTIDADE”.

O roteiro está traçado. Basta segui-lo. O que nem sempre é fácil. A leitura integral da Exortação Apostólica poderá servir-nos de bengala nos caminhos mais pedregosos…

Durante o ano que agora começa, sejam nossos passos justos aos olhos de Deus e retos aos olhos dos homens. E todos os dias serão santos.

(23/1/2019)

 

quarta-feira, janeiro 16, 2019

COMO O BEIJA-FLOR



Conta a fábula que, certo dia, um terrível incêndio invadiu a floresta. Desesperados, os animais fugiam em busca de refúgio. Enquanto isso, o beija-flor, a mais pequenina das aves, apanhava gotículas de água de um lago e lançava-as sobre o fogo. A águia, intrigada, perguntou: – “Ô pequenino, achas que vais apagar o incêndio sozinho?” – “Sozinho, sei que não vou”, respondeu o beija-flor, “mas estou a fazer a minha parte”.

Envergonhada, a rainha das aves chamou os outros pássaros e todos se juntaram na luta contra as labaredas.

Vendo isto, os elefantes e os restantes animais venceram o medo e cada um, a seu jeito, encontrou maneira de lutar contra o fogo. E, pouco a pouco, o incêndio foi-se extinguindo…

Lembrei-me desta história quando, na «Solenidade de Santa Maria, Mãe de Deus», participava na Eucaristia na grandiosa catedral de Burgos, a terceira maior de Espanha  e a primeira em estilo gótico (começou a ser construída em 1221).

Na homilia, o Senhor Bispo comentou a mensagem papal para o “Dia da Paz”, realçando o contributo da política para a paz. Começou pela saudação evangélica «A paz esteja nesta casa» e explicou que, segundo o Papa Francisco, “a «casa», de que fala Jesus, é cada família, cada comunidade, cada país, cada continente, na sua singularidade e história; antes de mais nada, é cada pessoa, sem distinção nem discriminação alguma. E é também a nossa «casa comum»: o planeta onde Deus nos colocou a morar e do qual somos chamados a cuidar com solicitude”.

De seguida, destacou: a política como meio fundamental para a paz. E, com o Santo Padre, alertou para o nosso dever de participar nos atos eleitorais: ”Cada renovação nos cargos eletivos, cada período eleitoral, cada etapa da vida pública constitui uma oportunidade para voltar à fonte e às referências que inspiram a justiça e o direito. Duma coisa temos a certeza: a boa política está ao serviço da paz; respeita e promove os direitos humanos fundamentais, que são igualmente deveres recíprocos, para que se teça um vínculo de confiança e gratidão”. E, com o nosso Papa, acrescentou: “Cada um pode contribuir com a própria pedra para a construção da casa comum. A vida política autêntica, que se funda no direito e num diálogo leal entre os sujeitos, renova-se com a convicção de que cada mulher, cada homem e cada geração encerram em si uma promessa…”.

E terminou com uma pergunta: - Que poderá fazer cada um de nós pela paz? Foi, então que refleti. Não poderei fazer muito, mas se, neste ano eleitoral, cumprir o meu dever de votar, satisfarei o conselho do Papa e, soube-o mais tarde, o pedido do Presidente da República; se viver em harmonia comigo mesmo, com os outros a começar pelos mais próximos, e com a natureza, estarei em paz com Deus.

Então, poderei dizer como o beija-flor: - “Estou a fazer a minha parte…”

(16/1/2019)

 

quarta-feira, janeiro 09, 2019

UM LAMENTO E UM LOUVOR



Em 20 de dezembro, o JN noticiava: “O diretor da Casa do Gaiato, P. Júlio Pereira, teme pela saúde dos utentes que, no início de novembro, foram retirados do Calvário, pela Segurança Social (SS)”. E acrescentava: “A SS garante que os utentes «tiveram de imediato acompanhamento médico» e que, no mesmo dia, «o plano terapêutico e as prescrições registadas no SNS foram solicitadas ao Agrupamento do Centro de Saúde local e enviadas para as instituições respetivas”. Tudo muito certinho. No entanto…

O amigo que já referi (cf. VP, 12/12/2018), delegado de informação médica, contou-me: “Em 12 de novembro, no Lar onde está minha irmã, reuni com um representante da administração, uma técnica e uma enfermeira. O que me causou mais preocupação foi uma lista que me mostraram onde figurava a medicação que ela estaria a tomar, ou iria tomar, que, excetuando dois fármacos que já tomava no Calvário, compreendia uma série de outros, de várias substâncias que não poderiam, de forma alguma, fazer parte de qualquer prescrição para seu uso. Creio ter havido, na indicação que me foi transmitida, uma mistura de medicações que talvez fizessem parte do conjunto das doentes provenientes da Casa do Calvário ou qualquer outra provável confusão.”
Mais ainda… Em 26 de novembro, às 20h56, enviou ao referido Lar um e-mail de que transcrevo: “Como é do vosso conhecimento, a minha irmã, atualmente ao vosso cuidado, deveria ser presente hoje numa consulta de Medicina Interna no Hospital Padre Américo. O seu caso clínico foi iniciado a partir de análises efetuadas (na altura estava ainda sob a responsabilidade da Casa do Calvário) cujos valores foram considerados anormais e que poderiam indiciar algo de grave, obrigou-a a um internamento prolongado no citado Hospital que mereceu todo o cuidado, tanto do estabelecimento hospitalar como da instituição que a acolhia. Como, até ao momento, não foi possível um diagnóstico definitivo, desloquei-me, hoje, ao respetivo serviço hospitalar na intenção de a acompanhar e saber da evolução do seu estado e do resultado duma ressonância magnética a que foi submetida. Dado que durante toda a manhã a minha irmã não compareceu à consulta (… ) ”. 
Às 21h19, recebeu a resposta: “Não foi feito o transporte à consulta por falta de meios logísticos. Não conseguimos arranjar ambulância nem bombeiros, nem na Cruz Vermelha. Não podíamos correr o risco de viajar na nossa carrinha sem condições para a sua irmã (…)”.
Lamenta e não compreende esta justificação porque sua irmã não tem qualquer deficiência física. “No Calvário, tal nunca aconteceria.”

Congratulo--me com o indulto concedido ao P. Baptista pelo Presidente da República com o apoio dos três ex- Presidentes da República que “defenderam a importância social do seu trabalho” (JN, 28/12/2018). O meu aplauso. (9/1)2019)

quarta-feira, janeiro 02, 2019

A GRATIDÃO EMBELEZA A ALMA

                                         
Estas as primeiras palavras de agradecimento ditas, na Sé do Porto, pelo P. Correia Fernandes, no final do 2º “Dia da Voz Portucalense” (13/2/2011).
Numa sociedade parca no agradecer, urge realçar gestos que nobilitam quem os pratica.
 
A Voz Portucalense, em 2010 – seu 40º Aniversário - organizou uma romagem à terra do fundador, D. António Ferreira Gomes, no dia do aniversário da morte de sua mãe, Albina de Jesus Ferreira Gomes (21/11/1965) – “O dia mais triste do seu exílio”.

Em Maio de 2011, em honra do seu primeiro diretor, editou o livro «Manuel Álvaro de Madureira – in memoriam» – “um livro para se comer” (15/6/2011), como disse D. Manuel Martins, um dos seus antigos alunos.
Aquando do seu falecimento, não esqueceu o P. Salgueirinho, com o título “Pastoral da Ternura” (30/11/2011), nem o P. Rui Osório, primeiro chefe de redação, com o texto “Homem Inteiro” (13/6/2018).
Nas suas Eucaristias, sempre rezou e evocou os antigos diretores e administradores, como se lê em “Na memória, a raiz da esperança” (29/3/2012).
Se assim enalteceu aqueles que a ajudaram a “ser a «voz» da Igreja, que na diocese do Porto se concretiza em torno da palavra, da graça e da caridade evangélicas” no dizer de D. Manuel Clemente., também homenageou os seus assinantes para quem criou o “Dia da Voz Portucalense” com a atribuição de diplomas comemorativos. Para lhes agradecer e receber novas assinaturas, visitou, com a colaboração amiga dos seus párocos:
Vila Nova da Telha /Sobrado /Gandra /Água Longa /S. Mamede do Coronado /S. Romão do Coronado /Muro /Santo Ildefonso /Valbom /Arcozelo /Anta /Guetim /Cete /Mouriz /Urrô /Labruge /Aveleda /Vilar do Pinheiro /Lourosa /Nogueira da Regedoura /S. Paio de Oleiros /Leça do Balio /Recarei /Sobreira /Parada de Todeia /Milhundos /Corim /Moreira da Maia /Agrela /Rebordosa //Santão /Caramos /Gueifães /Folgosa /Santo Isidoro /Constance /Toutosa /Maia /Gemunde /Palmaz /Travanca /Vergada /Argoncilhe /Canedo /Caldas de S. Jorge /Gulpilhares /Fiães /Vilar de Andorinho /Bustelo /Novelas /Subarrifana /Irivo /Macieira de Sarnes /Milheirós de Poiares /S. Martinho de Bougado /Carregosa /Seixezelo /Perosinho /Senhora da Hora /Oliveira do Douro /Fontiscos /Sta Cristina do Couto /Vermoim /Fânzeres /Santa Maria de Lamas /Santíssimo Sacramento /Árvore /Lordelo /Ordem /Casais /Nevogilde /Penafiel /S. Martinho de Campo /Retorta /Macieira da Maia /Crestuma /Lever /Lamoso /Figueiró /Vilar do Paraíso. Peço desculpa por eventuais omissões.
Celebrar a memória é semear a esperança”, disse D. António Francisco em “Dia da Voz Portucalense” ( 2/1/2019)