O Tanoeiro da Ribeira

quarta-feira, março 19, 2008

EDUCAR É SEMEAR

No “ Dia do Pai”Um semeador saiu a semear. E semeando, parte da semente caiu ao longo do caminho. (…) Outra parte caiu em solo pedregoso, (…) Outras sementes caíram entre espinhos (…) Outras, enfim, caíram em terra boa: deram frutos, cem por um, sessenta por um, trinta por um.” (Mat. 13, 4-8).
Se fosse hoje, este semeador, possivelmente, teria sido despedido: a grande maioria da semente nada produziu e a que caiu em boa terra nem toda obteve o rendimento máximo. Numa sociedade em que tudo é avaliado em função da sua eficácia, com objectivos bem definidos, não é fácil ser semeador. E, se todo o educador é um semeador…
Para começar, amigo leitor, gostaria de partilhar consigo uma história. Conta-se que um dia S. Francisco de Sales, padroeiro dos jornalistas, entrou na sua igreja, em Genebra, para pregar um sermão da Quaresma. Quando subiu ao púlpito, viu que a igreja estava totalmente vazia. Então, olhou para o sacrário e disse: Senhor, não tenho mais ninguém para me ouvir. Vais ser Tu o meu único ouvinte. E começou a pregar. Puro desperdício de tempo? Não. Diz a história que, quando o Santo desceu do púlpito e se dirigia para a sacristia, saiu de trás de uma das colunas da Catedral um homem que lhe disse: - Senhor Bispo, eu quero converter-me. Eu ouvi o seu sermão e agora vejo que o senhor acredita naquilo que diz.
Como educador da Fé, cumpriu o seu dever: lançou as sementes. O resto…
Os educadores têm entre mãos a mais bela das missões, a de colaborar na construção da pessoa humana, a única realidade que traz em si o apelo da Transcendência.
A educação pertence à pessoa e à família; tem uma dimensão que a coloca na ordem da cultura e não na ordem do Estado”, dizia D. António Ferreira Gomes.
Como estou a escrever para celebrar o “Dia do Pai”, dia litúrgico consagrado a S. José, esposo de Maria e “pai putativo” de Jesus, dedico aos pais esta minha reflexão.


ORIGINAL E AUTÓNOMO
Quando um pai está perante um filho tem sempre à sua frente um ser original e não uma cópia, um ser único e irrepetível. Todo o filho é filho único. Criar não é clonar.
Como ser inteligente e livre é capaz de se assumir como dono de si mesmo e responsável pelos seus actos. Educar para a autonomia pressupõe uma educação para a liberdade na responsabilidade. Dar liberdade sem exigir responsabilidade é favorecer a impunidade. Um pai nunca pode ser apenas um amigo ou um colega. A criança pode ter muitos amigos e colegas , pai só tem um. Por vezes, mesmo com sofrimento, é preciso saber dizer não… Como disse o Papa João Paulo II em Madrid, “ Mediante o amor, o respeito e a obediência aos pais, os filhos dão o seu contributo para a edificação da família. Isto tornar-se-lhes-á mais fácil se os pais exercerem sem fraqueza a sua autoridade como ministério verdadeiro e pessoal ordenado particularmente a proporcionar-lhes uma liberdade verdadeiramente responsável.”
Se os avós possuem um “amor benevolente”, os pais deverão exercer um “amor exigente”.

MORAL E SAGRADO
Nunca podemos esquecer que a criança é um ser finito com vocação de infinito. Os pais têm sempre perante si um ser criado à imagem de Deus que contém sementes de Eternidade. Razão tinha aquele pai que ajoelhava junto do berço do seu filhinho e rezava como se estivesse perante um altar. Já Cícero dizia: “res sacra homo” (o Homem é realidade sagrada).
Se o “Eu” se forma por oposição ao “Tu”, é na resolução dos conflitos entre o querer individual e o querer do outro que, pouca a pouco, se vai criando a noção do dever e se vai afirmando a consciência moral. Nesta formação, deverá estar sempre presente o imperativo moral que Kant definiu como “Age sempre de maneira a tratar a humanidade, tanto na tua pessoa como na pessoa de qualquer outro, sempre e simultaneamente como fim e nunca simplesmente como meio.” A palavra é necessária mas não basta. É fundamental que os filhos, ao observarem o comportamento dos pais, possam dizer: - Agora eu vi que acreditais naquilo que me ensinais.
Mas educar para os valores e para a dignidade da pessoa obriga a questionar-se sobre a sua origem. Como escreve Anselmo Borges, no livro “Deus no século XXI e o futuro do cristianismo”(1) , Pôr a questão da Fonte dos valores, (…) a questão do Sentido último, é pôr a questão de Deus. A questão de Deus enquanto questão é concretamente o fundamento da dignidade humana.(…) Nessa referência constitutiva do Homem à questão do Infinito, (…) o Homem aparece como fim e já não como simples meio.

EDUCADOR – PESSOA DE ESPERANÇA
Ao nascermos somos “uma sinfonia incompleta”. Somos um feixe de potencialidades. Cabe aos educadores ajudar ao seu desabrochar. Todos nós vamos nascendo… Como pessoas, também nós somos seres em construção. Um educador tem que estar atento a tudo o que afecta a si e ao seu educando. Ele é também a sua circunstância. O seu tempo é o hoje e nunca o passado. Mais ainda, se todo o homem é sempre um ser de futuro porque o presente não esgota a sua fome de viver, por maioria de razão, terá de o ser o educador. Ele sabe que as sementes que vai lançando só mais tarde germinarão. Um educador vive naqueles que ajudou a criar.
Porém, uma semente leva tempo a germinar e ninguém sabe se ela dará fruto. Daí, o sofrimento do educador/semeador. Mas, confiemos e, como São Francisco de Sales, semeemos boas sementes. O resto…
Porque o educador tem de ser uma pessoa de esperança, gostaria de vos deixar com as palavras que abrem a Encíclica Salvos na Esperança (1) do Papa Bento XVI:
SPE SALVI facti sumus” – é na esperança que fomos salvos: diz São Paulo aos Romanos e a nós também (Rm 8,24). A “redenção”, a salvação, segundo a fé cristã, não é um simples dado de facto. A redenção é-nos oferecida no sentido que nos foi dada a esperança, uma esperança fidedigna, graças à qual podemos enfrentar o nosso tempo presente: o presente, ainda que custoso, pode ser vivido e aceite, se levar a uma meta e se pudermos estar seguros desta meta, se esta meta for tão grande que justifique a canseira do caminho.”.
(1) – Encontra-se disponível na Livraria da Fundação Voz Portucalense.