O Tanoeiro da Ribeira

quarta-feira, junho 03, 2015

Foi na década de sessenta...


Ao passar em Leiria, (ainda não havia autoestradas), dei-lhe boleia. Apresentou-se como um cigano que vinha da “peregrinação dos ciganos”em Fátima e queria iria para Viana do Castelo. Combinámos que o deixaria na estação de Campanhã. Falámos longamente sobre o seu povo. Como nessa data, a Câmara do Porto tinha pedido ajuda à “Obra dos Bairros” na preparação da comunidade cigana da Areosa que, proximamente, iria ser transferida para o bairro de S. João de Deus, aproveitei para ouvir a sua opinião. Logo me perguntou se as casas eram de um só piso e tinham espaço para guardar os panos e cestos e corte para os burros. Outros tempos... Refletimos sobre as dificuldades na sedentarização dum povo nómada com hábitos muito próprios. E o interesse da conversa foi tanto que acabei por o levar a Viana. Ainda falei dessa conversa com responsáveis camarários mas sem qualquer resultado. O que foi pena, poder-se-ia ter evitado muitos problemas.
E porquê falar duma conversa com cerca de 50 anos? Por causa de duas notícias que li nos jornais.
A primeira, no JN de 1 de fevereiro, tinha por título “Esta escola também é dos meninos ciganos” e acrescentava: “Santo Tirso – Escola Básica de S. Bento da Batalha é exemplo de integração de crianças de etnia cigana”. Falava dum menino que “até ganhou prémios de mérito escolar”. A assistente social afirmava que “todos os meninos do bairro de Argemil, com 143 moradores, estão inscritos no pré-escolar e no 1.º Ciclo. Estes pais valorizam o sistema de ensino e percebem a importância da escola”. A diretora do Agrupamento completava que “a integração está feita em pleno”. E o jornalista esclarecia que “o pleno não é mera retórica: envolve os alunos e todos os encarregados de educação, ciganos ou não”. E acrescentava que o”exemplo estende-se à freguesia de Sequeiró e à escola “onde, num total de 82 alunos, 25 são ciganos”.
A segunda notícia, com o título “Ciganos agitam a Casa da Música” (JN, 28/4), dizia: “Para marcar a efeméride do Dia Mundial da Música, a Casa da Música organizou o espetáculo “Romani”. O espetáculo, em ensaios desde novembro, reúne as comunidades ciganas dos bairros do Seixo e da Biquinha, em Matosinhos.” E o diretor musical realçava que “a maioria destes músicos não sabe ler uma pauta, tocam tudo de ouvido. O maior trabalho que tenho é fazê-los parar de tocar. Por eles, estavam aqui todo o dia”. No dia 1 de maio, o mesmo diário informava: ”Comunidade cigana esgota Casa da Música – Rumbas ciganas puseram Casa da Música a dançar em pé”. E a Sala Suggia tem 1238 lugares...
Fico-me por estes dois bons exemplos da integração dum povo, originário do Punjab no subcontinente indiano, cujas migrações são conhecidas na Europa desde o século X. E a recordação de um homem bom...

( 3/6/2015)