"Estava enfermo e me visitastes"
As obras de misericórdia são catorze, sete
corporais e sete espirituais. As corporais são: Dar de comer a quem
tem fome. - Dar de beber a quem tem sede. - Vestir os nus. - Dar pousada aos
peregrinos. - Assistir aos enfermos. - Visitar os presos. - Enterrar
os mortos.
E as espirituais: Dar bom conselho. -
Ensinar os ignorantes. - Corrigir os que erram. - Consolar os tristes. -
Perdoar as injúrias. - Sofrer com
paciência as fraquezas do nosso próximo. - Rogar a
Deus por vivos e defuntos.
Assim aprendíamos e assim dizíamos no exame da Comunhão Solene.
Recordei-as,
no dia 14 de setembro, quando, entre os irmãos da Irmandade das Almas de S José
das Taipas, vi um rosto que jamais esqueci mas de quem nunca soube o nome.
Fiquei-lhe grato pelo apoio que nos deu quando nosso filho esteve internado no
IPO a fazer quimioterapia. Durante a adoração do Santíssimo, dei graças pelo
bem que, de forma generosa e anónima, os voluntários prestam nos nossos
hospitais. E, porque, estava próximo o de Santo António, a minha memória fez-me
regressar ao Seminário Maior do Porto dos inícios da década de sessenta.
Vivia-se então em rigoroso regime de internato, apenas quebrado por um passeio
semanal na tarde de 4ª feira. Inspirados pela espiritualidade de Charles de
Foucauld, o missionário dos Tuaregues assassinado em 1916 e beatificado em
2005, alguns seminaristas aproveitavam essa saída para visitar doentes naquele
hospital, com o apoio do seu capelão, P. Vieira Mendes. Não havia telefone
acessível aos doentes, nem telemóvel nem internet. Muitos dos doentes vinham do
interior do país e eram analfabetos. As viagens eram demoradas e caras. Com a
hospitalização, ficavam longe dos seus familiares. Para além da doença,
atormentava-os o isolamento a que eram obrigados. Quando os seminaristas
entravam numa enfermaria, logo havia braços no ar a pedir-lhes para ler ou
escrever uma carta. Para além das confidências dos doentes, esta tarefa criava
uma grande proximidade com o seu mundo e a sua dor e eles aprendiam a partilhar
o sofrimento. Era a sua “via-sacra” semanal. E quão enriquecedora!...
A perceção
das necessidades hospitalares levou-os a inscrever-se como dadores de sangue.
Ainda há pouco, vi um cartão de dador que assinalava: “primeira colheita em 29
de setembro de 1961”
Mais, na
Quaresma, com autorização do reitor, P. Miguel Sampaio, havia alunos, já
diáconos, que iam ajudar o P. Mendes a distribuir a Sagrada Comunhão pelas
muitas enfermarias do hospital. Ainda a cidade dormia e já eles calcorreavam as
velhas ruas do Porto histórico. Às 9 horas, estavam novamente no seminário para
as aulas. Sem tolerâncias nem desculpas.
Assim, no estudo, na oração e no serviço se iam
formando os futuros presbíteros diocesanos.
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