O Tanoeiro da Ribeira

quarta-feira, abril 24, 2013

Um profeta nos foi dado

Era este o sentimento que iluminava o rosto de quantos comigo participaram na Eucaristia no dia 17 do mês de março. O celebrante, a partir de São Mateus, “Tu és Pedro, e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja e as portas do inferno não prevalecerão contra ela”, fez uma emocionada profissão de fé na presença de Cristo na eleição do Papa Francisco: “Situações há em que quem escolhe são os homens, e Ele é que as paga, mas, neste caso, foi mesmo o Espírito Santo”. E baseava-se em três factos que classificou como sacramentais. Em primeiro lugar, a rapidez da eleição e a surpresa do escolhido. Muitos eram os nomes anunciados. E bastaram dois dias para surgir como eleito o Arcebispo de Buenos Aires de que ninguém falara. Depois, foi a sua origem num continente bem longínquo desta Europa, cansada e esgotada de valores evangélicos, em torno da qual sempre gravitou o papado. Vem do sul, um hemisfério explorado e com grandes manchas de miséria, e dum continente marcado por gritantes injustiças sociais, mas onde o cristianismo floresce como sinal de esperança, numa Igreja que se quer e faz companheira dos mais pobres. E, finalmente, o nome Francisco, pela novidade. Nunca nenhum papa ousou assumi-lo como lema. E, muito especialmente, pelo seu significado. Como ele próprio confessou, o Santo de Assis “é o homem da pobreza, da paz, o que ama e preserva a criação, o homem pobre”. “Ah, como eu queria uma Igreja pobre para os pobres”. O homem despojado de riqueza e de vaidades, pobre entre os pobres, para quem todas as criaturas eram irmãs. Que tinha no coração a humanidade e a criação inteiras. O santo que visionara a reconstrução da Igreja. Se, como ensina o Vaticano II, os sacramentais são sinais sagrados que manifestam a presença benfazeja de Deus e expressam a Sua bênção, então gostaria de acrescentar um quarto sacramental: o do sorriso. Quando, após a sua eleição, apareceu à janela, o que me surpreendeu, antes das palavras e gestos proféticos, foi o seu sorriso. Não um sorriso de conveniência, mas sim o sorriso autêntico que, via-se, vinha do mais fundo da alma. Um sorriso terno e tímido como que a pedir perdão por estar ali, a fazer-me lembrar o “desculpem-qualquer- coisinha”, e a querer dizer “ eu até nem queria, mas fui escolhido e, por isso, venho dizer-vos que aceito a vontade de Deus e pedir as vossas orações”. Um sorriso a desanuviar o rosto carrancudo dum mundo angustiado com a ameaça nuclear norte-coreana e das armas químicas na Síria, duma Europa desorientada e esmagada pela austeridade. Em dia de inverno, foi prenúncio de primavera; em tempo de quaresma, foi anúncio pascal. Francisco - o ”papa do sorriso”. Uma bênção. Um sopro do Espírito a surpreender um sistema de cooptação que, por natureza, resiste à mudança.