Criadores de beleza
Fazem-se coisas bonitas na minha cidade.
“Podemos sentir na contemplação uma espécie de alegria interior, essa mesma que procuramos e que se nos oferece na arte como êxtase”, escreveu Denis Huisman.
Quem não se emocionou ao ver o pôr do sol? Ao cheirar uma rosa? Ao ouvir um fado de Amália ou uma sinfonia de Beethoven? O homem tem esta capacidade única de se extasiar. Mas, mais que apreciador, é ele próprio fazedor de beleza.
Ao assistir na Casa da Música, ao “Concerto de Reis da Academia de Música de Costa Cabral”, nasceu em mim um cântico de ação de graças a Deus por estes dons que deu ao homem e de louvor aos artistas que fazem o mundo mais belo.
A Sala Suggia vestiu-se de gala não para ouvir os acostumados músicos de renome mundial, mas para se curvar silenciosa perante os jovens talentos que a iriam enriquecer.
No início, os cinquenta e sete jovens da Orquestra de Sopros da Academia interpretaram obras de Percy Grainger, Ralph Vaughan Williams e Gustav Holst. Foram trinta minutos de encantamento, não só pela qualidade das composições escolhidas mas, principalmente, pela sensibilidade e técnica postas na sua execução. Quando fechava os olhos, parecia ouvir uma das orquestras consagradas que já ali me emocionaram.
Na segunda parte, foi dado lugar às vozes que, apoiadas por 62 jovens instrumentistas da Orquestra Clássica da Academia, cantaram a “Missa das Crianças”. Nesta missa, Jonh Rutter seguiu o texto latino da ”Missa Brevis” a que juntou textos poéticos em inglês. Fiquei encantado ao descobrir como, em 2003, um compositor encontrou na música gregoriana inspiração para apresentar, com nova roupagem, melodias que, ao longo dos séculos, encheram mosteiros e catedrais. Tem razão quem considera o canto gregoriano a matriz da música europeia.
Foi uma ternura poder ouvir e admirar a postura e a interpretação dos 106 pequenos cantores. O branco das camisas e o vermelho das gravatas contrastavam com o negro que vestia o coro dos adultos, formado por centena e meia de coralistas do Orfeão de Rio Tinto, do “Encantus Corus” e do Coro dos Pais da Academia. A estas 252 vozes juntaram-se, ainda, a soprano Patrícia Silva e o barítono Pedro Telles. Foram trinta e sete minutos de puro gozo espiritual.
No final, foi a apoteose quando todas as vozes se uniram para, em uníssono, cantar o Adeste Fideles - “Vinde, adoremos o Senhor”.
Merecem elogios todos quantos nos ofereceram estes momentos de inesquecível “alegria interior”. Quão difícil terá sido ensaiar tão grande número de cantores na diversidade de grupos, vozes e idades... Está de parabéns a Academia de Música de Costa Cabral que ajuda a germinar a semente que faz dos seus alunos criadores de beleza.
A cultura é alma de um povo. Que não o esqueçam os responsáveis políticos…
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