NÓS EXISTIMOS UNS PARA OS OUTROS
Esta afirmação de Luís Moita, na sua ‘última lição’ na Universidade Autónoma, em 2019, deu título ao artigo assinado por António Marujo (7Margens) em 28/1/2023, data do seu falecimento.
Bem cedo, o primo Manuel Joaquim me falara, com admiração, do Luís Moita com quem fizera amizade em Roma. Posteriormente, seguiram caminhos diferentes, mas sempre que vinha a Portugal, parava em Lisboa para conversarem. Foi num desses encontros que me apresentou o seu amigo.
Para além da cosmovisão do Vaticano II e da sintonia no serviço pastoral, aproximou-nos o facto de, na “Semana Missionária” em Fátima (1961), eu ter convivido de perto com Carlos Alberto Pessoa Pais, de Torres Novas, seu colega no seminário dos Olivais.
Ficou-me na memória a fidalguia do porte e a transparência do olhar; a clareza das ideias e a firmeza das convicções; a paixão pelo ‘aggiornamento’ da Igreja e a sensibilidade à problemática sociopolítica.
Só mais uma vez nos voltámos a encontrar. Foi na paróquia de Santa Isabel no tempo do P. Armindo. Mas, através do meu primo e da comunicação social, segui de perto os momentos mais marcantes da sua vida:
A organização da vigília na igreja de S. Domingos (1968) contra a guerra colonial; o seu protagonismo na vigília da Capela do Rato; a sua prisão em Caxias, onde foi espancado e torturado, por ser contra a guerra; a sua libertação, com a irmã Conceição, em 26 de abril de 1974; a fundação e direção, entre 1974 e 1989, do CIDAC, uma organização de cooperação com os PALOP’s ; o apoio à campanha de Maria de Lourdes Pintasilgo; a condecoração com a ‘Grande Cruz da Ordem e Liberdade’ pelo Presidente da República, Jorge Sampaio, em 10 de Junho de 1998; o falecimento da sua irmã Maria da Conceição em 30 de abril de 2021 (cf.. ”Os Católicos e a Causa Pública – II”, VP, 21/4/2021).
Como académico, foi um dos “pilares” da Universidade Autónoma, no dizer do seu atual reitor. Brígida Brito, docente dessa universidade, recordou a “extrema capacidade” do seu antigo professor para “ouvir e compreender, negociar e ceder”, bem como o seu “enorme sorriso” quando chegava a cada aula, “cumprimentando com grande cordialidade e uma atitude informal e leve” que “cativou de imediato” os alunos.
No ISCTE-Instituto Universitário de Lisboa, foi o responsável pelo mestrado em Estudos da Paz e da Guerra.
Lecionou ainda no Instituto Superior de Serviço Social de Lisboa, foi professor convidado da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra.
Das homenagens publicadas aquando da sua morte, quatro me merecem realce:
. Do Presidente da República - “Luís Moita foi um democrata e um lutador pela justiça social, militante pela igualdade e pela liberdade do nosso e de todos os povos”.
. Do Presidente da Assembleia da República - "Luís Moita continuará bem vivo na memória dos que com ele aprenderam a estar no lado certo da história: na luta pela paz, a descolonização, a democracia mais avançada possível, a espiritualidade viva. Antes e depois do 25 de Abril, uma referência cívica e moral de várias gerações".
. Da Assembleia da República que aprovou por unanimidade um voto de pesar, lembrando-o como ‘uma referência cívica e moral de várias gerações, antes e depois do 25 de Abril’.
. De Joel L. Pinto, da Igreja Presbiteriana - “Travei conhecimento com o jovem padre Luís Moita que me impressionou pela sua elegância natural, o seu espírito crítico, as suas convicções sociais e a sua abertura ecuménica. (…) Gostaria de expressar aqui a minha imensa gratidão pessoal, como ex-colega e pastor protestante. Ele foi, para todos nós, o rosto de um catolicismo dialogante e respeitador do pluralismo confessional.” (7Margens, 2/2/2023)
Entre as outras mensagens laudatórias, uma houve que procurei, mas não encontrei. Lapso meu?
Quando um mês é passado sobre a sua morte, transcrevo uma afirmação sua que explicita a que assumi para título deste texto.
“Até posso inverter a lógica: o nós é igual ao eu + tu. Há uma anterioridade do plural sobre o singular: antes de sermos indivíduos, somos participantes de uma comunidade que nos faz ser nós próprios. A minha convicção é sobretudo esta: que nós existimos uns por causa dos outros. É o tecido das nossas relações que nos constitui como pessoas.” (1/3/2023)
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