A PRIMAVERA ESTÁ A CHEGAR...
Como sabe bem dar graças por mais um dia que
se abre ao sonho… Vem de longe este gosto, de tempos em que ainda não conhecia
o “Cântico das Criaturas”. Aprendi-o com as aves e as flores quando, bem
menino, guardava o gado na solidão dos montes. Ainda hoje me parece sentir o
chilreio dos passarinhos na ramagem dos carvalhos e as campainhas brancas a
florir nos valados.
Porque
são pobres as minhas palavras, sempre que posso, escondo-me na voz da poesia
que é, dizia Sophia, “sinal vivo de uma pátria anunciada” (Obra Poética).
Nos
últimos tempos, acompanha-me Daniel Faria (Poesia)
que, em “Se fores pelo centro de ti mesmo”,
me leva a revisitar recantos bíblicos iluminados pelo clarão do seu espírito.
No
«Génesis», escuto as palavras sofridas de Abraão, na hora da «Separação de Lot
(Gn 13)»: “Se fores pela direita/ Olharei em redor/ Se fores pela esquerda e
descansares/ Olharei em redor. / O meu olhar há-de acompanhar-te/ Como a poeira
à volta dos teus pés. / Se desceres à planície/ E fizeres a tenda com o véu da
mulher/ Não desviarei o olhar/ Não dividirei a túnica. / Se fores pelo centro
de ti mesmo/ Tactearei/ Abrirei a mão e estarás próximo/ Basta respirares/ E
olharei em redor.”
Quem
amamos, mesmo quando partiu para uma viagem sem retorno, habita sempre o mais
íntimo o nosso coração que o revê em cada pormenor.
Nos
«Provérbios», louvo o «Elogio da mulher (Pr 31,14»: “O coração da mulher é
alto/ mas nem só por isso a mulher oscila/ Ela é como o navio mercante/ Que
chega carregado de grão. / A mulher é o tear dentro da vida/ Nem só por isso a
mulher é mais que a vida/ Ela é como o navio mercante/ Que chega carregado de
grão.”.”
Em
S. João, (8,11) ouço os lamentos d’«A Mulher Adúltera»: “Não turbam a água dos
meus olhos/ As pedras que me atiram sobre o corpo/ As tuas mãos vazias este
muro/ Branco me doem muito mais”.
Serviram-me
de meditação no «Dia da Mulher». A mulher-mãe doba a vida dentro de si. Oferece
o grão que germina e alimenta. É regaço que não vacila. Mais que os punhos,
ferem os silêncios e os desprezos.
Em
S. Lucas, (19, 1,10), faz-me pensar nas palavras de «Zaqueu» - rico cobrador de
impostos - que se fez criança para ver Jesus: “A árvore foi a forma de te ver/
E desci para abrir a casa. / De me teres visitado e avistado/ Entre os ramos/
Fizeste-me passagem/ Do sol ao voo do pássaro/ Do sol à doçura do fruto. / Para
me encontrares me deste/ A pequenez”.
Ainda
hoje quando visitamos Jericó, somos levados a ver o sicómoro onde ele, qual
gaiato, se empoleirou.
A
humildade faz-nos “passagem” para os outros e mais visíveis aos olhos de Deus.
(18/3/2020)
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