"TU QUE TENS O NATAL DA SOLIDÃO..."
É,
pois, de louvar a iniciativa do Cónego Amadeu, então pároco de Campanhã que, em
1987, criou, na «noite da consoada», o “Natal dos Sós”. São do P. Milheiro, que
lhe sucedeu, as palavras: “Nunca sabemos quantos
serão. Atendemos chamadas, abrimos as portas e aguardamos. Cada rosto tem por
detrás uma história que respeitamos. Nessa noite estamos unidos na solidão que
decidimos vencer indo ao encontro uns dos outros. E tem mais calor esse Natal”.
A
“Casa dos Girassóis” está aberta a todos. Não se pergunta pelo IRS, pelo NIF,
nem pela idade, religião, naturalidade ou etnia. É, simplesmente, um amigo, um
irmão. Embora haja rostos que se tornaram familiares, sempre vão surgindo novos
olhares. Nos primeiros tempos, predominavam pessoas
ligadas à rua. A seguir, foi a presença significativa de timorenses. Depois,
vieram os imigrantes de Leste. Ultimamente, o grupo tornou-se mais estável,
sendo vários os casais que ali se acolhem em busca do calor que sua casa, agora
sem filhos nem pais, já não lhes oferece. E lembramos, com saudade, D. António
Francisco que partilhou dessa ceia, no primeiro Natal do seu ministério
episcopal no Porto.
Este
ano, como habitual, antes de se servir a ceia, fez-se a evocação do Natal com
cânticos e três poemas: “O Cântico das
Criaturas”, de S. Francisco, em sintonia com a Carta Apostólica «Admirável Sinal» do Papa Francisco; “Nasce Mais uma Vez” de Miguel Torga, com
vivências de infância que se quer perpetuar; e ”Coeleth (Ecl 12-1-7)” de Daniel Faria que nos faz dois apelos:
“
Lembra-te do teu Criador nos dias da mocidade/ A tua única herança para os
dias da desgraça./Antes que a noite seja noite e não vejas o sol nem as
estrelas nem os filhos. Antes que a tua única herança seja lembrança/ Antes que
o fio de prata se rompa e a roldana rebente no poço/ Antes de tudo isso/ Põe
uma escada e sobe ao cimo do que
vês”.
Este
último convite faz-me lembrar as técnicas cinematográficas dos planos «picado»
e «contrapicado»: os objetos, quando fotografados de cima para baixo,
esbatem-se e perdem relevo. A vida, vista de cima, liberta-nos e ganha maior
transcendência.
“Sobe ao cimo do que vês”. Um lema para o
ano que agora se inicia.
(14/1/2020)
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home