O Tanoeiro da Ribeira

quinta-feira, maio 24, 2018

O BOM SENSO



A celebração do “Dia Mundial das Comunicações Sociais” fez-me recordar a homilia que, há tempos, ouvi na igreja de Santo Ildefonso em Madrid. O celebrante começou por perguntar às crianças: - “Quais os sentidos que conheceis”. E elas lá foram dizendo: visão, audição, tato, gosto, olfato. – “Falta um, continuou o sacerdote, falta o sexto que é o «bom senso» e que muita falta faz…”

E o que é o bom senso?

O filósofo R. Descartes, na introdução ao “Discurso do Método”, escreveu:

O bom senso é a coisa do mundo melhor partilhada, pois cada qual pensa estar tão bem provido dele, que mesmo os que são mais difíceis de contentar em qualquer outra coisa não costumam desejar tê-lo mais do que o têm. (…) O poder de julgar de forma correta e discernir entre o verdadeiro e o falso, que é justamente o que é denominado bom senso.” O bom senso radica na capacidade de se assumir uma posição reflexiva face aos problemas que levará a bem julgar.

Já o teólogo Leonardo Boff escreveu:

O Papa Francisco revoluciona o pensamento da Igreja remetendo-se à prática do Jesus histórico. Ela resgata o que hodiernamente se chama “a Tradição de Jesus”.

O que mais ressalta em Jesus é o bom-senso. Dizemos que alguém tem bom senso quando para cada situação tem a palavra certa, o comportamento adequado e quando atina logo com o cerne da questão. O bom-senso está ligado à sabedoria concreta da vida. É distinguir o essencial do secundário. É a capacidade de ver e de colocar as coisas em seu devido lugar. O bom-senso é o oposto ao exagero. Por isso, o louco e o gênio que em muitos pontos se aproximam, aqui se distinguem fundamentalmente. O gênio é aquele que radicaliza o bom-senso. O louco, radicaliza o exagero.

Jesus evidenciou-se como um gênio do bom-senso. Um frescor sem analogias perpassa tudo o que diz e faz. Deus em sua bondade, o ser humano com sua fragilidade, a sociedade com suas contradições e a natureza com seu esplendor comparecem numa imediatez cristalina. Não faz teologia. Nem apela para princípios morais superiores. Nem se perde numa casuística tediosa e sem coração. Suas palavras e atitudes mordem em cheio no concreto onde a realidade sangra é levada a tomar uma decisão diante de si mesmo e de Deus.

Esse bom-senso tem faltado à Igreja institucional (Papas, bispos e padres), não à Igreja da base, especialmente em questões morais. Aqui é severa e implacável. Sacrifica as pessoas em sua dor aos princípios abstratos. Rege-se antes pelo poder do que pela misericórdia. Como é diferente o Papa Francisco…”

Se Descartes valoriza o pensar, L. Boff acentua o agir segundo a “Tradição de Jesus”

Termino com uma afirmação que vem do século XVII: “ Raramente atribuímos o bom senso aos outros, a não ser àqueles que estão de acordo connosco”.

Quão necessário ele é em nossos dias…

(24/5/2018)