O Tanoeiro da Ribeira

quinta-feira, fevereiro 23, 2017


Coração evangélico (II)

Depois de acentuar que, somente a partir do Amor de Deus, se pode organizar tudo, o teólogo galego, Torres Queiruga, explicita as duas grandes preocupações que, em sua opinião, balizam a Alegria do Amor: o respeito democrático e o coração evangélico.

- Quanto ao Respeito democrático, afirma: “Nunca na história do papado se havia proclamado, com tão unívoca energia, o valor do “sentir dos fiéis”, nem exercido, com tão clara consequência, o direito a serem consultados de forma direta. O último sínodo em volta dos problemas do amor e da família, com todas as limitações iniciais, foi, nesse sentido, um começo histórico.” Continua: “Sem dramatismos, cabe adivinhar um conflito íntimo entre o respeito ao espírito democrático – “sinodal”, se assim se prefere chamar-lhe – e a generosidade evangélica atenta ao coração. Quando se lê assim, impressionam a elegantíssima sabedoria pastoral e o profundo acerto teológico da Amoris laetitia. Creio realmente que não existe melhor chave para a entender no seu verdadeiro sentido e calibrar o alcance eclesial da sua mensagem.” E esclarece: “Notam-se duas preocupações claras. A primeira, a decisão de ser fiel à sinodalidade eclesial, que, em primeiro lugar e como é lógico, se manifesta na contínua referência às conferências episcopais. Porém que se estende sem limite aos demais membros da Igreja: aos teólogos, aos fiéis em geral, aos pensadores e inclusive aos poetas, como a surpreendente citação de Benedetti, prontamente acompanhada por outra de S. João da Cruz. Alguém reparou que, quando se dirige aos fiéis que se encontram a viver situações complexas, os convida a que «se aproximem com confiança a conversar com os seus pastores ou com leigos que vivem em entrega ao Senhor» (nº 312). A isso se une a cuidadosa comunhão com a doutrina dos seus predecessores, na qual, passando em silêncio aspetos superados pela passagem eclesial e teológica do tempo, sabe aproveitar aqueles que assinalam a continuidade autenticamente evangélica (leiam-se, por exemplo, a esta luz, as suas referências à Humanae vitae: n. 68 e 82”).

- No que concerne ao Coração evangélico, começa por afirmar: “A segunda preocupação constitui a nota de fundo que dá vida e marca, sem forçá-la juridicamente, a abertura renovadora. Não quer uma igreja paralisada pelo legalismo, mas sim aberta ao espaço, nunca suficientemente explorado, do amor de um Deus, que “ama a alegria dos seus filhos”, a alegria de todo “ser humano” (nº 147-148). É dentro desse amor, sem o abandonar nem ferir, que Francisco procura a resposta aos novos problemas.”

Este texto, que me foi aconselhado por um teólogo do Porto atento aos documentos do Magistério e às reflexões da Teologia, termina no próximo número.
(22/2/2017)