NASCEM PEQUENINOS
Picos de Urbião
As nascentes dos rios sempre me encantaram. Essa atração já
me levara até ao Mondeguinho, onde nasce o Mondego. Mas o maior desejo era ver
a origem do Douro.
E o sonho concretizou-se. De Sória, seguimos para Duruelo de
la Sierra, que, logo à entrada, expõe os brasões do concelho (onde o Douro
nasce) e do Porto (onde desagua): “Ciudades Hermanadas”.
Sentindo-nos em casa,
subimos de carro até próximo de Castro Viejo onde uma seta indicava a direção
para “Fuentes de Urbión”.
Seguiu-se uma estrada de macadame até um grande
largo. Era o fim. E agora? Um simpático espanhol informou-nos que, para chegar
à nascente do Douro, eram precisas mais duas horas a pé.
Assim fizemos, por
carreiros íngremes, entre pinheiros alpinos e faias de grande porte.
A partir
de certa altura, o arvoredo acaba dando lugar à penedia entrecortada por
vegetação rasteira de alta montanha.
Uma paisagem lunar abre-se em largos
horizontes que, por montes ondulados, levam o nosso olhar para bem longe. E lá
no cimo, dois grande cabeços graníticos escalvados. São os “picos de Urbión”
que separam três províncias: Sória, Logroño e Lugo. É aqui, nesta aridez
pedregosa, que nasce, tímido, o nosso Douro.
É um fio de água que se esgueira
por entre pedregulhos e se esconde no meio das ervas. Ao vê-lo tão pequenino,
apetece pegar-lhe ao colo. Com que meiguice o colhemos na concha da mão! Com
que ternura ouvimos o seu balbucio de bebé!
Sentado numa pedra, a
2080 metros de altitude, comentei com a minha companheira de aventura: - Mesmo
os grandes nascem pequeninos… Quem poderia imaginar que, neste fiozinho de água
que nos refresca os pés, está a origem dum grande rio ibérico: o terceiro em
cumprimento depois do Tejo e do Ebro; o segundo em caudal, logo após o Ebro; o
primeiro em bacia hidrográfica que, com 97 603 km2 de superfície, é bem maior
que Portugal? Que desce, impetuoso, da montanha, alarga-se tranquilo no
planalto, contorce-se nos profundos vales transmontanos e, depois de percorrer
897 km, acaba a descansar num amplo estuário antes de se fundir com as águas do
Atlântico?
Depois foi a descida, bem cautelosa, por causa da caruma e
das pedras soltas onde os sapatos escorregavam. Agarrávamo-nos aos arbustos …
Mas valeu a pena! Agora quando, na Ribeira do Porto, o vejo passar, majestoso,
apetece-me dizer-lhe: Olha que eu vi-te nascer!...
Caro leitor, que o novo ano, que ainda corre pequenino,
traga coisas boas e nos ajude a crescer “em sabedoria e graça diante de Deus e
dos homens” (Lc, 2, 52)
(VP, 4-1-2017)
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