O Tanoeiro da Ribeira

quarta-feira, janeiro 04, 2017

NASCEM PEQUENINOS


Picos de Urbião

As nascentes dos rios sempre me encantaram. Essa atração já me levara até ao Mondeguinho, onde nasce o Mondego. Mas o maior desejo era ver a origem do Douro.

E o sonho concretizou-se. De Sória, seguimos para Duruelo de la Sierra, que, logo à entrada, expõe os brasões do concelho (onde o Douro nasce) e do Porto (onde desagua): “Ciudades Hermanadas”.
 
 
Sentindo-nos em casa, subimos de carro até próximo de Castro Viejo onde uma seta indicava a direção para “Fuentes de Urbión”.
Seguiu-se uma estrada de macadame até um grande largo. Era o fim. E agora? Um simpático espanhol informou-nos que, para chegar à nascente do Douro, eram precisas mais duas horas a pé.
 
Assim fizemos, por carreiros íngremes, entre pinheiros alpinos e faias de grande porte.
 
 
A partir de certa altura, o arvoredo acaba dando lugar à penedia entrecortada por vegetação rasteira de alta montanha.
 
 
Uma paisagem lunar abre-se em largos horizontes que, por montes ondulados, levam o nosso olhar para bem longe. E lá no cimo, dois grande cabeços graníticos escalvados. São os “picos de Urbión” que separam três províncias: Sória, Logroño e Lugo. É aqui, nesta aridez pedregosa, que nasce, tímido, o nosso Douro.  
 
 É um fio de água que se esgueira por entre pedregulhos e se esconde no meio das ervas. Ao vê-lo tão pequenino, apetece pegar-lhe ao colo. Com que meiguice o colhemos na concha da mão! Com que ternura ouvimos o seu balbucio de bebé!
 

 Sentado numa pedra, a 2080 metros de altitude, comentei com a minha companheira de aventura: - Mesmo os grandes nascem pequeninos… Quem poderia imaginar que, neste fiozinho de água que nos refresca os pés, está a origem dum grande rio ibérico: o terceiro em cumprimento depois do Tejo e do Ebro; o segundo em caudal, logo após o Ebro; o primeiro em bacia hidrográfica que, com 97 603 km2 de superfície, é bem maior que Portugal? Que desce, impetuoso, da montanha, alarga-se tranquilo no planalto, contorce-se nos profundos vales transmontanos e, depois de percorrer 897 km, acaba a descansar num amplo estuário antes de se fundir com as águas do Atlântico?

Depois foi a descida, bem cautelosa, por causa da caruma e das pedras soltas onde os sapatos escorregavam. Agarrávamo-nos aos arbustos … Mas valeu a pena! Agora quando, na Ribeira do Porto, o vejo passar, majestoso, apetece-me dizer-lhe: Olha que eu vi-te nascer!...

Caro leitor, que o novo ano, que ainda corre pequenino, traga coisas boas e nos ajude a crescer “em sabedoria e graça diante de Deus e dos homens” (Lc, 2, 52)

(VP, 4-1-2017)