AS GAIVOTAS...
Há dias, passeávamos numa praia do norte quando um bando de gaivotas
brancas coreografava, no azul do céu, um bailado de sonho ao ritmo das ondas e
ao som do mar. Que delícia!... E apeteceu-me cantar: “Uma gaivota voava, asas
de vento coração de mar”. Estávamos maravilhados quando minha esposa deu um
grito de susto. Uma gaivota tinha deixado cair sobre ela um grande mexilhão que
acabara de apanhar nos rochedos. Ainda bem que não foi outra coisa… Como são
bonitas as gaivotas quando não estão sobre a nossa cabeça! Até dão para fazer
poesia e cantar… Mas quando pousam sobre as nossas casas, sujam os nossos
carros ou esvoaçam sobre nós, as coisas mudam de figura. E ficamos a pensar em
muitos outros comportamentos. Veio-me à mente aquela senhora que é tão amiga
dos gatos da rua que todos os dias lhes vai levar comida. Mas bem longe da
porta dela… Em sua casa não quer nenhum. E daquele senhor que não tinha carro
nem garagem, mas, como era muito amigo das pombas e gaivotas, todos os dias
lançava restos de comida sobre as garagens dos vizinhos que bem protestavam
porque não podiam estacionar os carros na rua, nem estender roupa nos pátios….
É tão bonito ser amigo esporádico e sem compromissos! E aquelas pessoas que são
muito simpáticas para a vizinhança mas infernizam a vida de quem com elas vive.
Como diz o povo, não faltam “santos, fora; diabos em casa”. Dizia-se
antigamente que quando se introduzia a causa de canonização dum sacerdote, a
primeira pessoa que o tribunal eclesiástico ouvia era a sua “canónica”(assim se
chamava à empregada doméstica dum padre) porque era ela quem melhor o conhecia.
Não custa nada ser boa pessoa à distância, o difícil é sê-lo para quem nos
atura todos os dias. Não é por acaso que se diz que a caridade bem ordenada
começa em casa, por aqueles que nos são mais próximos. Para já não falar dos
patrões que até recebem comendas e medalhas de benemerência, mas são parcos nos
vencimentos e fartos nas exigências para com seus trabalhadores…. E daqueles
que se arvoram em defensores dos operários mas tratam com sobranceria e abusam
de quem de si depende. E pensei naqueles que se associam a grandes campanhas na
internet, mas, no dia-a-dia, nada fazem pelos outros. E daqueles que clamam
contra a corrupção dos poderosos sem-vergonha, e muito bem, mas, quando
precisam, não deixam de recorrer à velha “cunha”…Nas Eucaristias, há quem, ao
Ofertório, cante a plenos pulmões “Fora eu rico, Senhor, e muito Vos daria”, mas
quando o cesto passa…. E aquele homem que se dizia apaixonado pela humanidade
mas não tinha paciência para ninguém em concreto, que referiu D. Manuel Clemente
na conferência “Virtualidades do Associativismo Local” em Matosinhos (11 de
março). Abstrações…Palavras…
Como são bonitas as gaivotas à distância!…
( 13-4-2016)
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home