O Minho não separa
Os muitos galegos que, neste Natal, visitaram o Porto fizeram-me lembrar o teólogoTorres Queiruga que, em Dezembro, na Fundação António José de Almeida, iniciou a conferência sobre “Deus e o sentido da existência”, dizendo: não sei se sois vós que, aqui no Porto, estais no sul da Galiza, ou sou eu que, em Santiago, estou no norte de Portugal…
Recordei, então, os padres galegos que, com ele, na Páscoa de 1970, tiveram uma longa conversa com D. António Ferreira Gomes, na sua casa de Milhundos, sobre o “Grupo Nós” e a matriz cultural luso-galaica. Este grupo de intelectuais, da primeira metade do séc. XX, deu à cultura galega uma dimensão que nunca antes tivera e criou a revista Nós em torno da qual se desenvolveu a vida política e cultural da Galiza entre1920 e 1936. Baseado na geografia, na história, na toponímia, na língua, defendia uma aproximação entre a Galiza e Portugal e afirmava a identidade matricial dos dois povos. Entre os portugueses que aderiram ao Nós, destacou-se o filólogo Rodrigues Lapa, que falava da Portugaliza : “Portugal estende-se naturalmente até às costas do Cantábrico. E, muito especialmente, Teixeira de Pascoaes.
Quando visitei o P. Fontes em Vilar de Perdizes, fiquei surpreendido ao ver que tinha todos os números da revista Nós. Logo no n.º 1, de 30 de Outubro de 1920, deparei com um texto que engrandecia o nosso poeta amarantino: Teixeira é o Revelador da Saudade, “esse sentimento que deu forma ao nosso lirismo, esse sentimento que está nas “ferbas das nossas almas e dos nossos corações” segundo a expressão de Cabanillas. Sentimento de que Teixeira fez “a Ética transcendente dos dois povos irmãos”. Portugal, diz em “Os Poetas Lusíadas”, revê-se na Galiza, encantado como num espelho maravilhoso que ao seu velho perfil restituísse o frescor, a graça, a luz de infância.
Nas cartas a um amigo galego, Pascoaes escreveu:” A Galiza é irmã e mãe de Portugal. Portugal saiu dos seios da Galiza; depois abandonou a Mãe e foi por esses mares fora, fugiu como filho pródigo. … Mas é chegado o tempo do seu regresso ao lar materno. Temos de voltar a viver espiritualmente em comum”.“ No outro mundo, há dois Espectros que se amam e vivem sempre juntos: Rosalia e Frei Agostinho. Confiemos no seu amor que nos há-de redimir do Estrangeiro”.
Se os políticos conhecessem a nossa cultura, certamente renovariam a “Linha do Minho” para facilitar o encontro destas duas pátrias irmãs que o rio “Minho não separa”. Talvez isso, como cria Pascoaes, nos pudesse ajudar a “redimir do Estrangeiro” que, hoje, dá pelo nome de Rating, Troika e outros “nomes feios” que conspurcam esta língua que traz em si o “lirismo saudoso” das “Ondas do mar de Vigo/ Se vistes meu amigo!”
Que a cultura lance pontes onde a política criou barreiras…
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