O Tanoeiro da Ribeira

terça-feira, junho 01, 2021

A LUZ E O CANDELABRO

“Não se acende uma candeia e se a coloca debaixo do alqueire, mas no candelabro, pois assim brilha para todos os que estão na casa (Mt, 5, 14)”. Face à exploração iníqua dos imigrantes em Odemira que a pandemia veio pôr a nu, interrogava-me: – “Antes, ninguém sabia? A comunicação social não se deu conta? E as redes sociais? E acima de tudo - esta interrogação deixava-me interiormente magoado - a Igreja local não tinha conhecimento? Foi, pois, com algum alívio que vim a saber que “há anos que a Igreja denuncia situações de verdadeira escravatura no Alentejo, sem conseguir captar a atenção dos média”. Entre 2010 e 2012, ”o então bispo de Beja, D. António Vitalino, denunciou diversas vezes a exploração dos imigrantes” (JN,10/5/2021). No passado dia oito, foi a vez de o arcebispo de Évora, D. Francisco Senra Coelho, num texto “Sobre a humilhante problemática dos migrantes no Alentejo", vir “refrescar a memória cultural, social e política do país” dando realce ao documento "Despovoação e Migração no Alentejo", da Comissão Diocesana Justiça e Paz de Évora, apresentado em conferência de imprensa em 04 de dezembro de 2019. Afirmou que, quando foi divulgado, "nenhuma resposta surgiu - exceto o silêncio de muitos"- para contrariar "esta nova forma de escravatura, mesmo tratando-se de um apelo urgente com consequências de desumanização". E, para explicitar o seu conteúdo, citou várias passagens, evidenciando que os problemas relacionados com a imigração foram diagnosticados e denunciados. Já então, o Alentejo estava a "ser um dos grandes recetores" da imigração, "não só a nível sazonal, mas também a título permanente, sobretudo para trabalhos relacionados com a agricultura". O documento, depois de informar que "a migração em causa é fundamentalmente proveniente do Brasil, dos países de Leste", como "Roménia, Moldávia, Ucrânia", e "da Ásia, [como] Índia, Paquistão, Nepal", punha o dedo na ferida e denunciava com muita clareza e frontalidade: "infelizmente, em muitos destes casos, suspeita-se a existência de tráfico de pessoas com exploração das mesmas, quer por máfias dos seus países de origem, quer pelas entidades empregadoras”. O senhor arcebispo acrescentou que a Igreja, já aí, manifestava a disponibilidade para "ser um parceiro privilegiado neste acolhimento", ajudando ainda "a uma melhor integração". E deixava o repto para a denúncia de "situações anómalas e não compagináveis com os princípios e os valores cristãos" e "da boa convivência entre pessoas", independentemente "da sua raça, género, religião". Mas estas e outras palavras caíram em saco roto e não encontraram eco nos meios de comunicação nem nas instituições políticas. E que divulgação mereceram nos órgãos informativos da Igreja? E nas homilias? E nos múltiplos encontros de formação? E nas escolas católicas? E nas aulas de Educação Moral e Religiosa Católica? E nos organismos pastorais? Acendemos fósforos mas não ateamos a fogueira… Falta-nos unidade no agir profético da denúncia. Razão tem o P. Fernando Calado quando no artigo “Odemira: é preciso saber denunciar!”(JN, 10/5/2021) diz que a Igreja “terá de encontrar melhores formas para passar a sua mensagem”. O País precisa duma Igreja que ‘suje as mãos’ nas impurezas da sociedade. (2/6/2021)