OS CATÓLICOS E A 'CAUSA' PÚBLICA
Faleceu no passado dia 30 de março. Os grupos parlamentares do CDS, PSD, PAN, PS, PCP, PEV e BE apresentaram na Assembleia da República um voto de pesar pela morte desta “destacada militante católica empenhada na luta pela liberdade contra a ditadura, pela paz contra a guerra colonial e pela justiça contra as desigualdades”, com a seguinte justificação:
“Neste contexto de contestação ao salazarismo e à guerra colonial, através de inúmeras ações concretas em que a intervenção política e a fundamentação evangélica se uniram, Maria da Conceição Moita veio a ser uma das organizadoras da vigília pela paz da Capela do Rato de 30 de Dezembro de 1972, uma das iniciativas mais emblemáticas levadas a cabo por católicos neste âmbito, tendo sido ela que leu a declaração que convocava a vigília de 48 horas de oração pela paz, assumindo o compromisso de dois dias de jejum completo, como protesto contra a situação de guerra que se vivia em Portugal, em solidariedade com as suas vítimas e contra a ausência de uma condenação por parte da hierarquia católica. Foi presa pela PIDE em 6 de dezembro de 1973, torturada, submetida a isolamento prolongado e ficou na prisão de Caxias até à Revolução de Abril de 1974, sendo, na sua figura frágil, um dos rostos mais fortes da libertação ocorrida em 26 de abril”.
Comentando este voto, o deputado José Manuel Pureza, em entrevista ao 7Margens, afirmou que “Pela sua vida de compromisso com a transformação da sociedade, pautado pelos critérios do Evangelho, a Xexão - como era conhecida- foi uma referência do combate pela democracia e pela liberdade. É um dos rostos icónicos do 25 de abril de 1974.” E acrescentou:
“A democracia tem uma dívida de gratidão para com aqueles homens e mulheres que deram corpo à ruptura do campo católico com a ditadura e a guerra colonial. Gente que se irmanou com quem combateu pela liberdade, encarando essa entrega como um serviço ao bem comum”.
Também a Câmara Municipal de Alcanena, onde nasceu e viveu até ao fim do ensino primário, aprovou, por unanimidade, em sua homenagem um ‘Voto de Reconhecimento e Pesar’.
Para melhor conhecermos a força e a raiz das convicções desta “mulher inteira”, “lutadora e fraterna”, como escreveu António Marujo (7Margens, 5/4), transcrevo algumas das suas palavras que nos falam dum Evangelho incarnado na vida pessoal e nos compromissos sociais.
. “Podem fazer o que quiserem que continuarei a lutar. Nem que tenha 80 anos quando sair daqui, vou continuar a lutar. E vocês hão-de cair!”- disse, quando estava a ser torturada pela PIDE.
. “Faz, Senhor, que nos deixemos acolher por ti, no mais fundo que há em nós, confiadamente. Liberta a nossa liberdade.”, escreveu, na oração lida na Rádio Renascença, (Nov/ 2005).
. “Na verdade, ir às raízes das injustiças e destruir-lhes a fatalidade é dever da Igreja. Há realidades que fazem parte do ‘mal comum’ que é urgente denunciar”, afirmou, em 2013, num Encontro de Reflexão Teológica.
. “Uma vida empenhada não prescreve. E nenhum de nós se pode dar ao luxo de considerar que já fez o que tinha a fazer. Resta o aqui e agora. O nosso tempo é este.” Foi o alerta que nos deixou, em 2014, num debate evocativo dos 40 anos do 25 de Abril.
(21/4/2021)
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