O Tanoeiro da Ribeira

sábado, julho 11, 2020

"DÁ-NOS UM DOM CUIDADOR"

 

No dia 24 de junho, no seu programa “Caminhos da História” do «Porto Canal», o historiador Joel Cleto disse que a festa a S. João resulta da «cristianização» das festividades pagãs do solstício de verão, “festas das colheitas com rituais propiciatórios da fertilidade”. E explicou que o S. João do Porto tem “pouco de cristianismo e muito dos rituais pagãos” que dão significado às orvalhadas, aos balões e fogueiras, às ervas aromáticas e manjericos, aos bailaricos e banhos no rio ou mar.

Mas não foi sempre assim. “Houve épocas com manifestações vincadamente católicas”. Marcas desses tempos são as “cabeças santas de S. João Baptista” que, no dia de S. João, atraíam multidões. Apresentou duas que ainda se conservam no Museu da Misericórdia do Porto e sua igreja e, referiu uma outra, que existiu no extinto convento dos Loios, objeto de grande devoção das gentes do Porto.

Outros tempos…Porque nos dias de hoje ,“As festividades a S. João na cidade do Porto não se revestem duma forma marcadamente religiosa”.

Não assim, em Braga.
No dia anterior, em entrevista à «Antena Minho», a propósito do lançamento da cantiga «Pandemia e São João” de que é autor, cantada pelos «Sinos da Sé», o etnólogo José Machado afirmou que o S. João de Braga “mergulha fundo no imaginário religioso, na vivência de valores catequéticos e religiosos”, procurando fazer da cidade um agregado de gentes, símbolos, ícones e valores religiosos”.

Foi este “imaginário” que o inspirou a criar uma cantiga que apela a valores tão necessários ao nosso tempo de grande “frustração existencial”. Neste sentido, faz-se eco da encíclica «Laudato Si - Sobre o cuidado da casa comum» em que o Papa “pede à humanidade que seja cuidadora” com as pessoas e a criação inteira.

Em sintonia com este pensamento, o entrevistador, comenta: -“Esta cantiga é uma oração”. - Exato, responde, é um canto motivador que segue de perto as orações que, nas romarias, os crentes fazem aos seus oragos”.

É uma espécie de ladainha, em ritmo binário com ressonâncias do paralelismo dos salmos, em que os dois primeiros versículos invocam as qualidades de São João e os dois últimos formulam a prece sempre mediada pelo pedido “dum dom cuidador”.

*Ó S. João inspirador /Dos excessos da folia. - Dá-nos um dom cuidador / Dá-nos sabedoria.

* Ó S. João propiciador /Do nosso divertimento. - Dá-nos um dom cuidador / Dá-nos conhecimento.

* Ó S. João motivador /Das paixões da mocidade - Dá-nos um dom cuidador / Dá-nos criatividade.

* Ó S. João regulador / Da festiva animação - Dá-nos um dom cuidador / Dá-nos a ponderação.

* Ó S. João anunciador /Do sentido da esperança - Dá-nos um dom cuidador / Dá-nos a perseverança.

Para invocar os dons da sabedoria, do conhecimento, da criatividade, da ponderação e da perseverança – cuidada gradação! – tão úteis para os tempos que passam, “Vamos botar uma cantiga / Em louvor de S. João. / O nosso tempo assim obriga /E a pandemia é a razão”. (8/7/2020)