O Tanoeiro da Ribeira

terça-feira, julho 26, 2016

O FENÓMENO HUMANO


 

Há livros que ficam na memória como o que dá título a este texto. Lembrei-o ao ler no Instituto Leonardo Coimbra, em S. Mamede Infesta, a afirmação do seu patrono: “O homem não é uma inutilidade de um mundo feito mas sim o obreiro de um mundo a fazer”

Freud, em1917, falava de três descobertas que, segundo ele, apearam o homem do seu trono: o heliocentrismo que, ao expulsar a Terra do centro do universo, retirou-lhe uma centralidade em que sempre acreditara; o evolucionismo darwinista que, ao afirmar o homem como fruto duma evolução contínua puramente biológica da natureza, despojou-o da honra de ter sido criado diretamente por Deus; a psicanálise que, ao realçar o “inconsciente” como raiz primordial do comportamento humano, esbate no homem a sua dignidade de animal consciente. 

É uma leitura pessimista da história humana. Mas outras são possíveis como a que Teilhard Chardin apresentou em “O Fenómeno Humano” (1965). Biólogo e paleontólogo, vê Deus no coração de todo o processo evolutivo. Se há quem afirme que a evolução é um puro efeito do acaso sem sentido, outros há que lhe atribuem um sentido mas explicado apenas pela dialética imanente à natureza. Já T. Chardin alia, na evolução, o imanente e o transcendente. E fundamenta a sua teoria em três conceitos. O primeiro é o de “terceiro infinito”. Ao infinito do imensamente grande (macrocosmos) e ao infinito do imensamente pequeno (microcosmos), acrescenta o “infinito em complexidade” que se manifesta na consciência. O homem é o mais altamente complexo e simultaneamente o mais profundamente interiorizado. O segundo é o “homem como novidade absoluta”. A evolução caminha para formas cada vez mais complexas, mas há dois momentos em que a evolução é substituída por um salto abrupto e inexplicável. Surge algo em absoluta descontinuidade, na passagem do inanimado para o animado e no aparecimento da consciência. Esta é uma nova forma de vida: um novo mundo interior. O terceiro conceito é do “homem portador da evolução”. A evolução não parou com o aparecimento do homem. Mas continua e o homem faz-se seu obreiro como agente da energia criadora de Deus. O homem torna-se não apenas instrumento mas prolongamento vivo do poder criador de Deus em ordem a formas sempre superiores de ser, de vida e de consciência. É uma evolução em marcha progressiva para o Ómega. “Eu sou o Alfa e o Omega” (Apoc. 1,8). “T. Chardin tomou esta metáfora na sua apresentação do ω como final da evolução humana, associado ao α da criação.” 

É uma visão que nos abre para horizontes de esperança. A Humanidade, em vez do “eterno retorno”, circular, percorre um caminho ascendente, em espiral, para uma perfeição maior que culmina em Deus.

Também nós somos “obreiros de um mundo a fazer”, como escreveu Leonardo Coimbra.

(20-7-2016)