O FENÓMENO HUMANO
Há livros que ficam na memória como o que dá título a
este texto. Lembrei-o ao ler no Instituto Leonardo Coimbra, em S. Mamede
Infesta, a afirmação do seu patrono: “O homem não é uma inutilidade de um mundo
feito mas sim o obreiro de um mundo a fazer”
Freud, em1917,
falava de três descobertas que, segundo ele, apearam o homem do seu trono:
o heliocentrismo que, ao expulsar a Terra do centro do universo, retirou-lhe
uma centralidade em que sempre acreditara; o evolucionismo darwinista que, ao
afirmar o homem como fruto duma evolução contínua puramente biológica da
natureza,
despojou-o da honra de ter sido criado diretamente por Deus; a psicanálise que,
ao realçar o “inconsciente” como raiz primordial do comportamento humano,
esbate no homem a sua dignidade de animal consciente.
É uma leitura pessimista da história humana. Mas
outras são possíveis como a que Teilhard Chardin apresentou em “O Fenómeno Humano” (1965). Biólogo e
paleontólogo, vê Deus no coração de todo o processo evolutivo. Se há quem
afirme que a evolução é um puro efeito do acaso sem sentido, outros há que lhe
atribuem um sentido mas explicado apenas pela dialética imanente à natureza. Já
T. Chardin alia, na evolução, o imanente e o transcendente. E fundamenta a sua
teoria em três conceitos. O primeiro é o de “terceiro infinito”. Ao infinito do imensamente grande (macrocosmos)
e ao infinito do imensamente pequeno (microcosmos), acrescenta o “infinito em
complexidade” que se manifesta na consciência. O homem é o mais altamente
complexo e simultaneamente o mais profundamente interiorizado. O segundo é o “homem como novidade absoluta”. A
evolução caminha para formas cada vez mais complexas, mas há dois momentos em
que a evolução é substituída por um salto abrupto e inexplicável. Surge algo em
absoluta descontinuidade, na passagem do inanimado para o animado e no
aparecimento da consciência. Esta é uma nova forma de vida: um novo mundo
interior. O terceiro conceito é do “homem
portador da evolução”. A evolução não parou com o aparecimento do homem.
Mas continua e o homem faz-se seu obreiro como agente da energia criadora de
Deus. O homem torna-se não apenas instrumento mas prolongamento vivo do poder
criador de Deus em ordem a formas sempre superiores de ser, de vida e de
consciência. É uma evolução em marcha progressiva para o Ómega. “Eu sou o Alfa
e o Omega” (Apoc. 1,8). “T. Chardin tomou esta metáfora na sua apresentação do ω como final da evolução humana,
associado ao α da criação.”
É uma visão que nos abre para horizontes de
esperança. A Humanidade, em vez do “eterno retorno”, circular, percorre um
caminho ascendente, em espiral, para uma perfeição maior que culmina em Deus.
Também nós somos “obreiros de um mundo a fazer”,
como escreveu Leonardo Coimbra.
(20-7-2016)
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