O Tanoeiro da Ribeira

quarta-feira, setembro 02, 2015

UM MAR DE ESPERANÇAS


Vem de muito longe o meu fascínio pelo Alentejo. Remonta à meninice quando meu pai, nas longas noites de inverno à lareira, pegava na guitarra e, acompanhado à viola pelo Ti Zé Branco, cantava: “Abalei do Alentejo/Olhei para trás chorando/Alentejo da minh'alma/Tão longe me vais ficando”. Comecei a sentir saudades dum Alentejo que ainda não conhecia. Por isso, quando pude, fui à procura dessa terra dos meus sonhos. Já acompanhado pelos filhos que, apaixonados pelo Asterix, queriam encontrar romanos em todos os castelos. Numa Páscoa, apoiado pelo Guia de Portugal da Gulbenkian, rumámos ao sul. Foi com espanto que descobri, no coração do Alentejo, bem próximo do Guadiana, um monte coroado por um castelo. Era Monsaraz. Nunca dele ouvira falar. E foi com um misto de receio e deslumbramento que subimos a estrada esburacada que serpenteava encosta acima e calcorreamos as ruas da cidadela. Apesar do seu ar decrépito de “velha senhora”, logo nos apaixonámos pela riqueza do património, pela magia do silêncio, pela escuridão da noite estrelada, pela paisagem sobre os campos alentejanos onde as papoilas salpicavam de vermelho o verde dos trigais. Era um Alentejo, dourado no verão, de pastores e rebanhos nos montes que bordejavam os caminhos. Em cada taberna ouvia-se o “cante alentejano”. E as pessoas como as senti acolhedoras! Numa tarde de verão, já lá vão mais de 30 anos, parei o carro junto do castelo de Mourão. Logo um pequenito me perguntou: - Quer visitar o castelo? Vou chamar o meu tio que foi almoçar. - Não, para já o que queríamos era beber água. - Venham comigo. E nós lá seguimos o Carlitos, era este o seu nome. E qual não foi o nosso espanto quando o vimos bater a uma porta e dizer: - Ó mãe, estão aqui uns senhores do Porto com os meninos que querem água. Logo a mãe nos mandou entrar para a sala. E, passado uns momentos, ofereceu-nos água nos mais fino serviço de copos que teria. Amabilidade e finura de trato.
Os tempos mudaram. O Alentejo está diferente. Mas as pessoas continuam amáveis. Há uns 5 anos, perto do Alqueva, perguntei a um senhor onde haveria um barco para dar uma volta pela albufeira. Disse-me: - Eu acompanho-o ao local. No carro, fomos conversando. No regresso, pediu-me para estacionar à sombra dum chaparro junto de sua casa. Saiu e chamou: - Ó Lurdes, a “sopa de cação” também chega aqui para estes amigos do Porto? Chegou. E que saborosa! E o melão com queijo? Que delícia... Ainda neste verão ouvi um grupo de amigos cantar alentejano numa adega de Mourão.
Das muralhas de Monsaraz, onde, outrora, se via o verde do trigo, vê-se, agora, o azul do Alqueva, o maior lago artificial da Europa. Que belas as margens e refrescantes as suas águas! É um novo Alentejo a nascer...



( 2/9/2015)