O Ateísmo Freudiano (II)
Freud reconhece a pouca firmeza da sua
argumentação: “Se as ideias religiosas não podem,
racionalmente, ser provadas também não podem ser negadas”. Ao
ler seus escritos sobre religião (Actos Obsessivos e Práticas
Religiosas, 1907; Totem e Tabu, 1913; O Futuro duma Ilusão, 1927;
Moisés e o Monoteísmo, 1939), ficou-me a impressão de que, ao
longo de 32 anos, buscou argumentos para justificar a sua tese.
Porquê esta fixação? Por que é que Freud nunca ousou
psicanalisar o seu ateísmo?
Três factores
costumam ser apresentados.
1. A
psicanálise nasce ligada ao cientismo do século XIX. O
conhecimento científico assumia-se, então, como o único válido e
absoluto. A. Comte, paladino do positivismo, “ensinara mesmo que
as explicações científicas dos fenómenos naturais e sociais
deveriam ser complementadas com a institucionalização de uma nova
religião” (Amadeu Araújo, Um erro de Afonso Costa)
2.
Em criança, teve uma ama católica que o levava a assistir aos atos
religiosos. Severa perante as transgressões, ameaçava-o com o fogo
do inferno. Esta “velha pré-histórica” fora despedida de sua
casa por ter roubado. Sofreu e sentiu uma grande desilusão quando
soube a motivação. Também em criança, viu o pai, por ser judeu,
ser humilhado pelos vizinhos.
3.
Abrigava preconceitos contra o cristianismo em geral, a religião
que através dos séculos havia infligido tão incontáveis
sofrimentos ao seu povo. Sentia-se marginalizado e em
1938, com a invasão nazi, teve de fugir de Viena e refugiar-se em
Londres onde morreu
em 1939.
Concluindo...
Viviam-se dias de incerteza. Como escreveu Brecht em1928, “Porque
eu já o tinha esquecido/ao trucidado, e faz-me lembrar/Diariamente
de vós, que estais vivos,/De vós que não fostes abatidos./Afinal
porque não?” Freud é filho desse tempo e duma nação vítima
do holocausto. O seu pessimismo leva-o a negar Deus porque “seria
bom de mais que ele existisse”. Isto, porém, não retira
pertinência à sua análise de cariz antropológico. Seria fácil
dizer que não passa duma teoria sem base histórica ou experimental
como seria de exigir ao “pai da psicanálise”; que o que estava a
seu favor também podia ser contra; que a religião de que fala não
é cristã; que lhe falta fundamentação teológica... Mas a verdade
é que, ainda hoje, há práticas, ditas cristãs, que continuam a
dar-lhe argumentos.
Para
terminar lembro as palavras introdutórias da Encíclica “Fé e
Razão” de João Paulo II: “A fé e a razão constituem como que
as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a
contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do
homem o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de O
conhecer a Ele, para que, conhecendo-O e amando-O, possa chegar
também à verdade plena sobre si próprio.”
(15/7/2015)
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