No quinto centenário de Sá de Miranda
O doutor Aurélio Oliveira, catedrático
jubilado da Universidade do Porto, fez o desafio. O Grupo “Sinos da Sé” de Braga
aceitou-o. E assim nasceu o CD Cantar Sá de Miranda,
gravado na escola Sá de Miranda e recentemente editado.
Mas
quem é este português de quinhentos que, ainda hoje, merece ser
cantado? Um “guarda-cabras”, como se intitula na carta que
escreveu ao Rei D. João III, que ousa atacar a frivolidade da Corte
- “Homem dum só parecer/dum só rosto e d' ua fé,/d'antes quebrar
que volver/outra cousa pode ser,/ mas de corte homem não é”. Um
poeta que critica a macrocefalia de Lisboa - “Não me temo de
Castela,/ mas temo-me de Lisboa,/ que o Reino nos despovoa.”;
denuncia os Senhores - “fortes
amos/querem que os adoremos”,
a má distribuição da riqueza - “um possui de serra em
serra/outro nada ou dous tojais”, os funcionários prepotentes -
“Executores da lei, /havei vergonha algum dia!”, a ostentação
de algum clero - “quanto padre que passea/em fim, ventre e bolsa
cheia.” António
Ferreira, seu contemporâneo, diz: “Novo mundo, bom Sá, nos foste
abrindo/com a tua vida e com teu doce canto”. Almeida Garrett
afirmou:”Sá de Miranda, verdadeiro pai da nossa poesia, um dos
maiores homens do século, foi o poeta da razão e da virtude”.
José Machado no libreto do citado CD esclarece: “Sá de Miranda
foi o tipo de homem da cultura que transitou da vida palaciana para a
residência rural. Este tipo de português erudito e sujeito
interveniente político que se retira dos negócios e da “coisa
pública” para se dedicar à produção literária, mas sempre
atento à orientação geral do reino e das gentes, é protótipo do
intelectual integrador, reformista e renovador da vida cultural do
seu povo.”
Nasceu em Coimbra
em 1481. De ascendência fidalga, estudou em Santa Cruz e frequentou
a Universidade onde alcançou o título de doutor em Direito. A
fidalguia e a cultura abriram-lhe as portas da Corte. Por curiosidade
intelectual, foi viver para Itália, durante 5 anos, onde conviveu
com os maiores vultos do renascimento da época. Regressado a
Portugal, foi de novo bem recebido na Corte. Mas, passados quatro
anos, inesperadamente, deixou tudo e recolheu-se às terras de “Entre
-Homem-e-Cávado”, onde casou e veio a morrer, em 1558, na sua
quinta da Tapada em Amares. Como diz o subtítulo do CD, Ainda não
é tarde para evocar quem fez da escrita uma contínua
intervenção social e literária e, como um profeta, assumiu a
missão de denunciar a soberba dos poderosos, a corrupção dos
políticos, os vícios da sociedade, a ostentação e a degradação
dos costumes. Um exemplo para os dias de hoje...
Vale a pena
conhecê-lo nas suas trovas à maneira antiga, poesias bucólicas,
sonetos, canções, elegias, cartas, comédias.
(4/1/2015)
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