O Tanoeiro da Ribeira

quarta-feira, janeiro 21, 2015

A civilização do espetáculo


As palavras que o Santo Padre dirigiu ao pessoal do Centro Televisivo do Vaticano no dia 13 de dezembro (VP, 17/12/2014) fizeram-me lembrar, em contraponto, o que o “Prémio Nobel”, Mário Vargas Losa, escreveu no livro que deu título a este texto. Segundo ele, vivemos num “mundo onde o primeiro lugar na tabela dos valores vigente é ocupado pelo entretenimento e onde divertir-se, fugir ao aborrecimento, é paixão universal”. E acrescenta “Converter a propensão natural para passar uns bons momentos num valor supremo tem consequências inesperadas: a banalização da cultura, a generalização da frivolidade e, no campo da informação, que prolifere o jornalismo irresponsável da bisbilhotice e do escândalo”. Deu-se uma inversão de prioridades e “as notícias passam a ser importantes ou secundárias sobretudo, e às vezes exclusivamente, não tanto pelo seu significado económico, cultural e social e mais pelo seu caráter insólito, escandaloso e espetacular”. As publicações que mais conquistam o público são as revistas do coração. As pessoas gostam muito das “notícias sobre como os ricos e famosos se casam, descasam, vestem, despem, brigam, ficam amigos e gastam os seus milhões, os seus caprichos e gostos, desgostos e maus gostos”. O mais eficaz para divertir e entreter é o que alimenta as baixas paixões, como “a revelação da intimidade do próximo, sobretudo se for uma figura pública”. Farejar a sujidade alheia dá mais colorido à monotonia da vida. Quando acontece uma desgraça, os jornalistas esforçam-se por transformar as vítimas em peças de um espetáculo que se apresenta como informação necessária, mas cuja função é saciar a curiosidade perversa dos consumidores de escândalos. Esta curiosidade corrói as vastas maiorias a que nos referimos quando falamos de opinião pública. “Essa vocação maldizente, escabrosa e frívola é a que dá o tom cultural do nosso tempo”. As catástrofes amenizam muito a vida das pessoas. Todas, desde os terramotos e maremotos até aos crimes em série e, sobretudo, se neles houver agravantes de sadismo e de perversões sexuais. “Por isso, na nossa época, nem a imprensa mais responsável pode evitar que as suas páginas se vão tingindo de sangue, de cadáveres e de pedófilos”.
Reconhece que “nenhum jornal pode sobreviver se desobedecer de maneira absoluta aos traços distintivos da cultura que converteu o entretenimento passageiro na aspiração suprema da vida humana e o direito de contemplar com cinismo e desdém tudo o que aborrece, preocupa e nos faz lembrar que a vida também é drama, dor, mistério e frustração”. Qual a minha atitude face a esta cultura do divertimento?
(21/1/2015)