HOMENS E MULHERES EM BUSCA DE PAZ
Ao visitar uma cidade, gosto de me deixar “perder”
pelas ruas, em busca do inesperado. Foi o que aconteceu na última viagem que
fiz a Madrid, quando, no Parque do Retiro, fui surpreendido pela exposição Palimpsesto, de Doris Salcedo, uma
artista colombiana que tem desenvolvido o seu trabalho em torno do sofrimento
dos excluídos. Do chão do “Palácio de Cristal”, construído para exaltar a
história de Espanha, brotam gotas de água que, lentamente, se unem até formar
nomes de homens e mulheres que, fugindo à fome e à guerra, se afogaram no
Mediterrâneo, vítimas dos traficantes da morte e da complacência dum mundo de
indiferença. Só em 2017, foram mais de três mil…
Os nomes que
vão aparecendo e desaparecendo impelem-nos a tomar consciência das vidas
concretas que se escondem atrás deles e que a morte ceifou para sempre.
Estremecemos com os naufrágios que encheram as nossas televisões e que, pouco a
pouco, deixam de ser manchete. A violência das imagens vai-nos insensibilizando…
num processo inconsciente de autodefesa…
A autora quer representar a violência sem violência.
Pensa que só a linguagem poética pode ajudar-nos a descobrir a (sem) razão da
violência e, deste modo, contribuir para que a sua experiência não se banalize.
A arte pode evitar o esquecimento, ajudando a criar uma relação afetiva, e não
apenas emocional, com aqueles que sofrem.
E não há dúvida que o consegue. Bastava ouvir o
silêncio religioso e ver o cuidado com que os visitantes pisavam aquele chão
sacralizado. E quantos olhos se humedeciam ao tentar descobrir o nome que ia
nascendo à sua frente. Eram retângulos e mais retângulos. E em cada um, surgiam
e desapareciam nomes. Tudo começava por uma gotícula a que, lentamente, outras
se iam juntando em letras que formavam um nome e outro e outro, sucessivamente:
Alsaho, Yacouba, Rose, Islam, Alan, Ermias, Mohamede, Adama, Baboucare,
Abdulhan, Halilin, Randa, Bizi, Ali, Talu, Sidoo, Ghulam. Não é um anónimo nem
uma abstração. É uma pessoa com nome. São múltiplos os nomes que se sucedem mas
cada um é único. Não é um número mas uma vida criada e querida por Deus para
ser feliz. Com direito a viver, como eu, como cada um dos visitantes. Um
coração que, certamente, amou e foi amado. Um ser humano que vinha em busca de
um mundo onde pudesse viver e em paz. Alguém que, simbolicamente, vimos nascer,
crescer e morrer... Quantas esperanças e quantos sonhos desfeitos… São nomes
que nos invadem, interpelam e provocam. Sentimo-nos olhados por dentro.
Como escreveu o Papa Francisco na mensagem para o
51º “Dia da Paz, citando Bento XVI, ” são homens e mulheres, crianças, jovens e
idosos que procuram um lugar onde viver em paz”. (10/1/2018)
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