O Tanoeiro da Ribeira

quinta-feira, novembro 02, 2017


Memória e Gratidão (I)

 

 
 

        Um mês é passado. Mas os ecos da morte de D. Manuel Martins continuam. Este chegou-me de Itália através dum email que me foi enviado da Galiza. O original poderá ser lido em www.settimananews.it/profili/portogallo-morto-vescovo-rossona.

Francesco Strazzari começa por dar a notícia: “No passado dia 24 de Setembro, faleceu na cidade da Maia, arredores do Porto, o Bispo Dom Manuel Martins.” E acrescenta em nota pessoal:

          “A última vez que eu estivera com ele foi a meados de Agosto. Conhecia Dom Manuel Martins desde os anos 80, quando ele era Bispo de Setúbal: foi o primeiro Bispo daquela Diocese populosa e «vermelha», lá na margem sul do Tejo, acabada de destacar do Patriarcado de Lisboa”.

          Depois de informar que aí nem todos receberam bem o bispo que “provinha do norte de Portugal, região rica, burguesa e tradicionalista”, esclarece: “ Mas bem depressa se percebeu que Dom Manuel era de outra têmpera. Não tardou por isso a chamarem-lhe «Bispo Vermelho».

E conclui: “Não havia no aspeto de Dom Manuel nada de extraordinário, para além de um olhar de homem muito vivaz e inteligente, numa mistura equilibrada de racionalidade, fruto dos estudos que cursara, com o sentimento típico das gentes lusitanas. A casa onde morava era muito simples, mesmo espartana. E tinha um falar melodioso, doce e convincente.”

Após esta nótula de quem conhecia bem D. Manuel, enquadra a sua ação no contexto histórico da Igreja em Portugal, antes e após a «revolução dos cravos» - “A mão esquerda de Deus”

“Em 25 de Abril de 1974, fora Portugal sacudido pela revolução que Dom Manuel considerava e dizia ter sido uma bofetada da mão esquerda de Deus. A bofetada da mão direita de Deus fora o Concílio Vaticano II. Eram os tempos da ditadura de Salazar. A Igreja oficial dava cobertura ao Regime. O controverso cardeal patriarca de Lisboa, Gonçalves Cerejeira, não mexeu um dedo quando o bispo do Porto, Dom António Ferreira Gomes, um homem de vasta cultura filosófica e teológica, ao regressar do estrangeiro viu fecharem-se lhe as fronteiras. Teve de vaguear pela Europa ao longo de dez anos, tão somente por ter posto em causa e em discussão a política ditatorial de Salazar, sobretudo a guerra colonial”.

Comenta: “A «revolução dos cravos» foi delineando um novo rosto da Igreja portuguesa: abandonar o modelo clerical e dar mais espaço aos leigos. Estes saíram para a ribalta e pressionaram a hierarquia a fazer escolhas precisas tanto no campo económico como no campo social.” 

E deixa um reparo: “Lamentava-se Dom Manuel por essa altura: «A Igreja deve estar com os homens. Mas não o tem feito suficientemente. Tem ainda muito medo. É preciso arriscar. A Igreja não vive a pobreza”.

 

(Continua)          (31/10/2017)