O Tanoeiro da Ribeira

quarta-feira, outubro 22, 2014

Um Missionário dos três continentes


 

“Deve o missionário africano ser padre e artista, pai e mestre, doutor e homem da terra; deve tão depressa tomar a estola, como empunhar a picareta para arrotear uma courela.”  Estas e muitas outras palavras de D. António Barroso, apesar de localizadas no tempo, fazem-me lembrar o Papa Francisco que aconselha os Pastores a ter o cheiro das ovelhas e a “escutar os sinais deste tempo e perceber os odores dos homens de hoje”.  D. António Barroso passou por três continentes e em todos deixou a marca da sua bondade e santidade aliadas à ação e ao caráter de quem não recua perante as dificuldades. Numa hora de grande apreensão disse com humor: há duas coisas de que não morrerei: de parto ou de medo. O Dr. António Trigueiros, na conferência que, do dia 19, pronunciou em Remelhe, comparou-o a um “meteoro” pelo muito que fez no pouco tempo que viveu em cada região e pela brevidade da sua vida terrena.

Nasceu pobre. Seus pais quando casaram foram viver numas divisórias do alpendre da Casa de Santiago que lhes subarrendaram os caseiros. Foi aí que em 5 de novembro de 1854 nasceu. Quem já visitou estes “modestos aposentos”, cuja memória os atuais proprietários preservam, testemunha o que disse o Dr. Trigueiros ”O nascimento dá-se numa simplicidade e precaridade que recorda o do Menino de Belém”. Desta conferência, por limitação de espaço, realço apenas três notas simbólicas:

1ª - Conta o seu biógrafo que “Uma vez, ao regressar da África, a Câmara Barcelos promoveu-lhe aparatosa recepção. Das pessoas que se acumulavam no Salão Nobre, muitos se ajoelharam, à entrada do santo apóstolo do Bem, e, entre essas pessoas a Dona Adelaide Limpo. Pois D. António, avistando-a, reconhecendo-a, logo interrompeu a cerimónia, aproximou-se dela, fê-la erguer-se e exclamou: “Então Vª Exª , que tantas vezes me matou a fome, ajoelhada diante de mim?! Deixe-me antes dar-lhe um abraço”.

2ª Das fotografias projetadas no power point, uma houve que me fez lembrar a frase de São Francisco de Sales “um santo triste é um triste santo” e confirmou o que D. Ana Joaquina Senra, sua companheira de infância, dissera em entrevista ao Diário do Norte em 1951: “ele era muito brincalhão”. Via-se um bebé em cuja cabeça ele colocara a mitra episcopal após o ter batizado.

3ª Uma referência que nunca vi mencionada. O Dr.Trigueiros disse-o na palestra e confirmou-me em particular que, após o exílio em Remelhe, D. António Barroso presidiu na Paço de Sacais ao casamento do grande pintor amarantino, Amadeo de Souza-Cardoso, com Lúcia Pecetto, no dia 26 de setembro de 1914, como o próprio escreveu na sua agenda. Fez há pouco cem anos. E o Porto ignorou. Como é fraca a memória e parca a gratidão dos homens!...

(22/10/2914)