Para bem ajudar
A
recente visita do Santo Padre à Terra Santa aliada à sua mensagem para o Dia
Mundial das Comunicações Sociais trouxe-me à mente a reflexão que, no ano 2
000, fiz na antiga estrada que desce de Jerusalém para Jericó onde a tradição
coloca o episódio que nos fala do “Bom Samaritano” (Lc10,30). Ao ver aquele local
medonho no fundo de um barranco, pensei no que poderia ter levado o sacerdote a
não prestar atenção ao homem que agonizava no seu caminho: viu e passou adiante. Descia de Jerusalém onde trabalharia.
Dirigir-se-ia para sua casa. Que preocupações lhe encheriam a mente? Que medos
o atormentariam? E, mais do que condená-lo, refleti no que ainda hoje nos
acontece. Não é verdade que, por vezes, andamos tão angustiados com a vida que
nem reparamos na miséria dum vizinho, no rosto triste de um amigo, no silêncio
de um filho, nos olhos húmidos da esposa? Quantos medos e desconfianças não nos
inibem a espontaneidade! Como diz o papa Francisco, o outro não será para nós “um
estranho de quem é melhor manter distância”?
Em
contraponto, um samaritano viu e moveu-se
de compaixão. Desceu do cavalo, tratou-lhe as feridas, deixou-o numa
estalagem, comprometendo-se a pagar o que fosse preciso pelo seu tratamento. Na volta to pagarei. E seguiu viagem. O
samaritano é um exemplo não só porque ajudou mas também pelo modo como ajudou. O
seu gesto faz-nos pensar no cuidado que se deve ter quando se presta uma ajuda.
É que algumas pessoas, embora bem-intencionadas, tornam-se incómodas e intrometidas.
Fazem lembrar aquele jovem que, para cumprir a sua “boa ação diária”, ajudou uma velhinha a atravessar a
passadeira. Só que ela não ia atravessar… Há pessoas a quem apetece dizer:
ajude… mas não tanto. Na ânsia de ser úteis, não veem que estão a ultrapassar
os limites. É que até nas ofertas e nos gestos de delicadeza pode haver violência…
A ajuda nunca pode invadir a intimidade do outro nem afetar a sua autonomia.
Ajudar, sim, mas com equilíbrio para que a virtude não se transforme em vício.
Razão tinha o grande Aristóteles que escreveu: “Sendo assim, um mestre em qualquer arte evita o excesso e a falta,
buscando e preferindo o justo meio. Estou falando da virtude, pois é esta que
se relaciona com as emoções e ações, e nestas há excesso, falta e justa medida”.
E Séneca, filósofo latino contemporâneo de Jesus, dizia: Toda a virtude assenta na justa medida, e a justa medida
baseia-se em proporções determinadas. Penso que é neste
sentido que deve ler-se o que diz a Bíblia (Ecl 7, 16) “Não sejas justo excessivamente, nem sábio
além da medida. Porque te tornarias estúpido”.
É como o sal na comida: nem de mais, nem de menos… Na próxima semana, explicitarei três situações em que este equilíbrio
se torna bem difícil.
(3/7/14)
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