“E o Senhor Bispo era um Santo…
Minha mãe, nascida em 1905, gostava de recordar-me os seus tempos de menina, quando o “Senhor Abade”, maltratado pelos carbonários e expulso da residência paroquial, viera viver em sua casa. E acrescentava, “até o Senhor Bispo, que era um santo, foi preso”. Nunca me disse o nome do “Senhor Abade” nem do “Senhor Bispo”.
O tempo passou, as memórias desvaneceram-se. Só muito mais tarde é que associei D. António Barroso àquele bispo de longas barbas brancas de que minha mãe falava.
Estas evocações vêm a propósito de um centenário que passou no dia 7 de Março passado. Nesse dia, mas de 1911, D. António Barroso foi julgado, condenado e expulso da sua Diocese do Porto.
E porquê?
- Não foi ele o jovem missionário que reorganizou a Missão do Congo ao serviço da Igreja e com a gratidão do Rei: o maior aplauso e louvor, por actos que tanto o recomendam ao reconhecimento nacional?
- Não foi ele o Prelado de Moçambique que mereceu o testemunho do Comissário Régio: Crescera o pessoal do sacerdócio, fundavam-se novas paróquias, criavam-se missões. Dignificava-se o culto, o Prelado embrenhava-se nos sertões para reconhecer as necessidades da diocese, as suas virtudes austeras sem intolerância inspiravam respeito e simpatias que redundavam em autoridade moral para o clero?
- Não foi ele o Bispo de Meliapor que ajudou a resolver graves conflitos na igreja da Índia?
- Como Bispo do Porto, preocupou-se com a Assistência aos Tuberculosos; impulsionou as Escolas agrícolas; acarinhou o Asilo de Vilar, o Recolhimento das Meninas Desamparadas, as Irmãzinhas dos Pobres, o Círculo Católico Operário; impulsionou a Associação dos Médicos Católicos e criou a Associação de Protecção à Infância.
- O próprio decreto governamental que o condenou não pôde ignorar o seu mérito: D. António Barroso prestou outrora relevantes serviços à Pátria portuguesa e é dotado de incontestáveis virtudes pessoais que o impõem como homem ao respeito dos seus conterrâneos.
Então por que foi condenado?
-Porque, com o Arcebispo de Évora, foi o autor da Pastoral Colectiva dos Bispos Portugueses; porque escreveu a Afonso Costa dizendo-lhe para não publicar legislação contra a Igreja sem a submeter à aprovação da Assembleia Constituinte a eleger; porque, contrariando as ordens do Governo, não proibiu a leitura da Pastoral Colectiva na sua Diocese e responsabilizou-se pelos padres que foram presos por a terem lido, que, por isso, foram libertados. Só regressou à Diocese em 1914. E voltou a ser desterrado em 1917.
D. António Ferreira Gomes, no centenário do seu nascimento, considerou-o da estirpe “dos Assis, dos Xavieres e dos Britos”.
Era um santo. “Vox Populi…”. Estamos a aguardar a conclusão do processo da sua beatificação.
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