O Tanoeiro da Ribeira

quarta-feira, novembro 03, 2021

CASA DA CONSCIÊNCIA

“Este homem foi um santo.” Assim disse D. António Monteiro, bispo de Viseu (1988-2004), junto do seu túmulo em Cabanas de Viriato. Em 17 de junho de1940, dia em que, por razões de consciência, abriu o consulado de Bordéus para conceder vistos a milhares e milhares de judeus, e não só, Aristides Sousa Mendes disse: “Mesmo que me destituam, só posso agir como cristão, como me dita a minha consciência; se estou a desobedecer a ordens, prefiro estar com Deus contra os homens do que com os homens contra Deus.” Em 17 de junho de 2020, o Papa Francisco, perante bispos de todo o mundo, declarou: “Hoje é o Dia da Consciência, inspirado no testemunho do diplomata português Aristides de Sousa Mendes, que há 80 anos decidiu seguir a voz da consciência. É um dia que marcará a história da humanidade”. E acrescentou: “O seu exemplo deve servir para que a liberdade de consciência seja respeitada sempre e em todo o lado e que cada cristão possa dar mostras de coerência com uma consciência reta e iluminada pela palavra de Deus!” E quem foi este cristão que, por dever de consciência, sacrificou a sua vida e a dos seus? Por ter desobedecido às suas ordens, Salazar exonerou-o sem qualquer reforma, impedindo-o de exercer a advocacia e proibindo os filhos de frequentar a Universidade. Sem dinheiro, recolheu-se à sua “Casa do Passal” em Cabanas de Viriato, onde, no inverno para se aquecer, disse-me um seu vizinho, chegou a queimar alguma da mobília. A casa acabaria por ser vendida para saldar dívidas. Morreu em Lisboa, em 1954, "pobre e desonrado". Já em 2005, no livro de história “A Grande Viagem” cuja autoria partilho com Fátima Silva, escrevemos, sob o título Um Homem com H grande: “Nasce em 19 de julho de 1886, em Cabanas de Viriato. Em 1938, é nomeado cônsul em Bordéus (França). É nessa cidade que se encontra quando rebenta a Segunda Guerra Mundial (1939); é aí que se vai jogar a sorte de muitos fugitivos aos horrores da guerra, às perseguições e campos de concentração nazis; é também aí que Sousa Mendes pôs a nu as suas qualidades humanas”. No dia 19 de junho, escrevi no facebook: “Fomos de alongada até Cabanas de Viriato para prestar homenagem ao "Herói da Humanidade", cônsul em Bordéus, que, contrariando as ordens de Salazar, concedeu vistos de entrada em Portugal que salvaram a vida de cerca de 30 mil refugiados. A sua casa que, quando a visitei em 2011, estava em grande ruína, agora já foi restaurada no exterior, mas o interior continua em triste abandono”. Já, em 2011, lá tínhamos estado nas vésperas do 57.º aniversário da sua morte, como dei conta na VP (23/3/2011): “Fui até Cabanas de Viriato à procura de memórias deste herói a quem o “Memorial do Holocausto”, construído em Jerusalém, honra com o título de“ Justo entre as nações”. (…) Estou a evocar este Português Maior, no dia (19/10/2021) em que, em cerimónia presidida pelo Presidente da República, a sua memória foi solenemente acolhida no Panteão Nacional com o descerramento da lápide: “ARISTIDES SOUSA MENDES -1885 – 1954 - JUSTO ENTRE AS NAÇÕES – DIPLOMATA”. Apenas uma pergunta… - Se o Papa Francisco criou o “Dia da Consciência” em homenagem a Aristides de Sousa Mendes, porque não fazer do solar onde nasceu e viveu a “Casa da Consciência”? (3/11/2021)