PRENDA DE NATAL
Hoje é véspera de Natal de 2007. Logo à noite iremos a Amares consoar em casa dos pais da minha Eli. Iremos todos, incluindo os meus sogros. Amanhã, se Deus quiser, virão todos almoçar a nossa casa. Estamos felizes por isso, até porque vi muita felicidade nos olhos do meu João e da minha Eli.
Acaba de me telefonar o P. Fernando Milheiro, meu pároco, a perguntar se logo à noite vou estar presente no “Natal dos Sós” que se realiza, há já muitos anos, no refeitório do “Patronato de Campanhã”. Disse-lhe que, como sempre tem acontecido desde o início, lá estaria. Perguntou-me ainda se eu poderia levar um ou dois poemas para ler durante a breve cerimónia que precede a partilha da refeição (“habituou-nos mal…”). Já escolhi dois poemas: “No Presépio” de Gomes Leal e “Hino de Amor” de João de Deus.
Mas será tudo felicidade?
Ontem, o meu amigo e padrinho de casamento Freitas Soares, na Missa que cantámos na Trindade, deu-me um texto escrito por mim há muitos anos. Possivelmente, terá sido escrito em Julho de 1971. Fui participar numa semana de Pastoral em Paris a que se seguiu o Colóquio Europeu de Paróquias em Estraburgo. Como no domingo intermédio não poderia estar na paróquia, pedi-lhe para ele presidir à Celebração da Palavra e ler a homilia que eu lhe deixava escrita. Foi esse texto que ele ontem me trouxe.
Porquê uma prenda de Natal?
Para ajudar a resposta, eu vou transcrevê-lo.
"O homem perante a dor
I – Sofrimento – uma realidade e um problema
Apesar de todos os progressos das ciências e da medicina, os homens continuam a sofrer.
Apesar dos grandes esforços da humanidade, feitos ao longo dos séculos, o sofrimento ainda é hoje uma realidade que acompanha o homem, desde o berço até à sepultura. – dores físicas e morais, dores provenientes de si mesmo ou causada pelos outros. É justo que, perante tudo isto, o homem se pergunte: “donde provém o sofrimento e para que serve?” “Qual o sentido da dor, do mal e da morte que, apesar do enorme progresso hoje alcançado, continua a existir?”
II – O sofrimento à luz da Bíblia
a) No Antigo Testamento
A dor aparece logo nas primeiras páginas da Bíblia. Por causa da sua desobediência, o homem é expulso do paraíso e lançado para uma terra amaldiçoada onde a dor, as doenças, e a morte aparecem como castigo desse primeiro pecado.
Assim, a dor aparece, logo no início, relacionada com o pecado.
Em todo o Antigo Testamento, aparece esta relação entre sofrimento e pecado, e, pelo contrário, à ausência de pecado corresponderá uma ausência de sofrimento.
O problema do sofrimento perpassa o Antigo Testamento. Não aparece uma resposta satisfatória. Há quem veja no sofrimento uma satisfação pelo pecado; quem o encare como uma prova; como um aperfeiçoamento pessoal e quem lhe dê um carácter redentor.
b) A dor no Novo testamento
A catequese cristã e os próprios Evangelhos apresentam o sofrimento e morte de Cristo como elementos essenciais. E, de facto, até Jesus, conquanto tivesse curado muitos doentes, não se furtou ao sofrimento. Pelo contrário, a missão de Jesus, como Messias, há-de consistir principalmente em sofrer e morrer em conformidade com a vontade do Pai.
Jesus aceita essa vontade e prediz que o sofrimento há-de acompanhar os que entrarem no seu Reino.
Cristo não procura mas também não exclui o sofrimento, antes o aceita voluntariamente e chega ao ponto de proclamar “felizes os que choram”.
III – O Cristão perante a dor
A exemplo do Mestre, uma única atitude pode ser tomada pelo cristão perante o sofrimento: aceitá-lo voluntariamente. O sofrimento é, pois, parte essencial da vida cristã:
- o sofrimento configura-nos com Cristo. “ Sofrendo por nós, não só nos deu o exemplo para seguirmos os Seus passos, mas também abriu um novo caminho, em que a vida e a morte são santificadas e recebem um novo sentido” G.S. 22
- o sofrimento deve ser enfrentado com alegria. S. Paulo não se envergonha dos seus sofrimentos, antes se alegra com eles. Os Apóstolos saíram cheios de alegria do Sinédrio por terem sido dignos de padecer vexames pelo nome de Jesus (Act. 5,41)
- O sofrimento prepara-nos para o Reino de Deus. Escreve S. Paulo “Nós mesmos nos gloriamos de vós nas Igrejas de Deus, pela vossa constância e fé, no meio das perseguições e tribulações que suportais. É isto uma prova do justo juízo de Deus, para que sejais dignos do Reino de Deus, pelo qual padeceis” (2 Tes.1,4-5)
Quem conhece o sofrimento por que temos passado, nos últimos dois anos, compreende o título deste meu texto.
Alguém escreveu que “o acaso é o pseudónimo que Deus usa quando não quer assinar as suas obras”E as interrogações surgem. Foi tudo por acaso? Por que é que o Freitas Soares reteve este texto, perdido no meio dos livros? Por que é que essa homilia haveria de tratar o tema do sofrimento? Por que é que só agora descobriu esse texto?
Não será Deus a querer que eu concretize na vida aquilo que pregava com as palavras?
Nunca imaginei quão difícil é pôr em prática aquilo que se prega. Como o Evangelho é exigente …
Prenda de Natal? O sentido redentor do sofrimento. Que Deus nos ajude, especialmente ao meu filho José e à minha Anita. Que lhes dê, nos dê a todos, familiares e amigos, muita força para continuarmos a encontrar um sentido para a vida.
E esta será a melhor prenda de Natal que eu poderia desejar.
Acaba de me telefonar o P. Fernando Milheiro, meu pároco, a perguntar se logo à noite vou estar presente no “Natal dos Sós” que se realiza, há já muitos anos, no refeitório do “Patronato de Campanhã”. Disse-lhe que, como sempre tem acontecido desde o início, lá estaria. Perguntou-me ainda se eu poderia levar um ou dois poemas para ler durante a breve cerimónia que precede a partilha da refeição (“habituou-nos mal…”). Já escolhi dois poemas: “No Presépio” de Gomes Leal e “Hino de Amor” de João de Deus.
Mas será tudo felicidade?
Ontem, o meu amigo e padrinho de casamento Freitas Soares, na Missa que cantámos na Trindade, deu-me um texto escrito por mim há muitos anos. Possivelmente, terá sido escrito em Julho de 1971. Fui participar numa semana de Pastoral em Paris a que se seguiu o Colóquio Europeu de Paróquias em Estraburgo. Como no domingo intermédio não poderia estar na paróquia, pedi-lhe para ele presidir à Celebração da Palavra e ler a homilia que eu lhe deixava escrita. Foi esse texto que ele ontem me trouxe.
Porquê uma prenda de Natal?
Para ajudar a resposta, eu vou transcrevê-lo.
"O homem perante a dor
I – Sofrimento – uma realidade e um problema
Apesar de todos os progressos das ciências e da medicina, os homens continuam a sofrer.
Apesar dos grandes esforços da humanidade, feitos ao longo dos séculos, o sofrimento ainda é hoje uma realidade que acompanha o homem, desde o berço até à sepultura. – dores físicas e morais, dores provenientes de si mesmo ou causada pelos outros. É justo que, perante tudo isto, o homem se pergunte: “donde provém o sofrimento e para que serve?” “Qual o sentido da dor, do mal e da morte que, apesar do enorme progresso hoje alcançado, continua a existir?”
II – O sofrimento à luz da Bíblia
a) No Antigo Testamento
A dor aparece logo nas primeiras páginas da Bíblia. Por causa da sua desobediência, o homem é expulso do paraíso e lançado para uma terra amaldiçoada onde a dor, as doenças, e a morte aparecem como castigo desse primeiro pecado.
Assim, a dor aparece, logo no início, relacionada com o pecado.
Em todo o Antigo Testamento, aparece esta relação entre sofrimento e pecado, e, pelo contrário, à ausência de pecado corresponderá uma ausência de sofrimento.
O problema do sofrimento perpassa o Antigo Testamento. Não aparece uma resposta satisfatória. Há quem veja no sofrimento uma satisfação pelo pecado; quem o encare como uma prova; como um aperfeiçoamento pessoal e quem lhe dê um carácter redentor.
b) A dor no Novo testamento
A catequese cristã e os próprios Evangelhos apresentam o sofrimento e morte de Cristo como elementos essenciais. E, de facto, até Jesus, conquanto tivesse curado muitos doentes, não se furtou ao sofrimento. Pelo contrário, a missão de Jesus, como Messias, há-de consistir principalmente em sofrer e morrer em conformidade com a vontade do Pai.
Jesus aceita essa vontade e prediz que o sofrimento há-de acompanhar os que entrarem no seu Reino.
Cristo não procura mas também não exclui o sofrimento, antes o aceita voluntariamente e chega ao ponto de proclamar “felizes os que choram”.
III – O Cristão perante a dor
A exemplo do Mestre, uma única atitude pode ser tomada pelo cristão perante o sofrimento: aceitá-lo voluntariamente. O sofrimento é, pois, parte essencial da vida cristã:
- o sofrimento configura-nos com Cristo. “ Sofrendo por nós, não só nos deu o exemplo para seguirmos os Seus passos, mas também abriu um novo caminho, em que a vida e a morte são santificadas e recebem um novo sentido” G.S. 22
- o sofrimento deve ser enfrentado com alegria. S. Paulo não se envergonha dos seus sofrimentos, antes se alegra com eles. Os Apóstolos saíram cheios de alegria do Sinédrio por terem sido dignos de padecer vexames pelo nome de Jesus (Act. 5,41)
- O sofrimento prepara-nos para o Reino de Deus. Escreve S. Paulo “Nós mesmos nos gloriamos de vós nas Igrejas de Deus, pela vossa constância e fé, no meio das perseguições e tribulações que suportais. É isto uma prova do justo juízo de Deus, para que sejais dignos do Reino de Deus, pelo qual padeceis” (2 Tes.1,4-5)
Quem conhece o sofrimento por que temos passado, nos últimos dois anos, compreende o título deste meu texto.
Alguém escreveu que “o acaso é o pseudónimo que Deus usa quando não quer assinar as suas obras”E as interrogações surgem. Foi tudo por acaso? Por que é que o Freitas Soares reteve este texto, perdido no meio dos livros? Por que é que essa homilia haveria de tratar o tema do sofrimento? Por que é que só agora descobriu esse texto?
Não será Deus a querer que eu concretize na vida aquilo que pregava com as palavras?
Nunca imaginei quão difícil é pôr em prática aquilo que se prega. Como o Evangelho é exigente …
Prenda de Natal? O sentido redentor do sofrimento. Que Deus nos ajude, especialmente ao meu filho José e à minha Anita. Que lhes dê, nos dê a todos, familiares e amigos, muita força para continuarmos a encontrar um sentido para a vida.
E esta será a melhor prenda de Natal que eu poderia desejar.
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