O Tanoeiro da Ribeira

quarta-feira, dezembro 09, 2020

AO SERVIÇO DA FÉ E DA CULTURA

Vi-o pela primeira vez numa Eucaristia em que participei na igreja de Rio Tinto. Soube, então, que era cónego da Sé de Lamego, de que fora deão, e, agora, vivia naquela cidade em casa da sua afilhada Virgínia que o acompanhou desde que foi lecionar teologia na UCP, em Lisboa, até ao seu falecimento (22/12/2016), tendo sido sepultado em Moldes, Arouca, sua terra natal. Voltei a encontrá-lo no Liceu Carolina Michaelis em 24 de maio de 2001. Foi com surpresa e agrado que ouvi a sua palestra integrada no “Colóquio Internacional sobre Carolina Michaelis”. Surpresa, porque não sabia que o elogiado conferencista, Dr. Mendes de Castro, era o circunspecto presbítero que residia em Rio Tinto; agrado, pela elegância e consistência da sua comunicação. Há dias, sob o título “No Centenário do Cónego Dr. Mendes de Castro”, o P. Justino Lopes publicou, na “Voz de Lamego”, um artigo que, com vénia, passarei a citar. Apesar de algumas supressões, espero não desvirtuar a verdade nem o calor da mensagem. “Doutorou-se em Teologia pela Universidade de Comillas, seguindo depois para o Instituto Bíblico de Roma. Na volta, ficou professor do Seminário. Era um bom articulista e, semanalmente, aguardávamos ansiosos a Voz de Lamego para ler o Editorial quase sempre escrito por ele. Foi meu professor de Dogmática e Sagrada Escritura. Não levava livro nem apontamentos. Expunha a lição citando a Bíblia ou os Santos Padres em hebraico, grego ou latim. Nas raras chamadas era muito humano, muito compreensivo. E, nos exames, procurava não entalar o aluno, pelo contrário, dava-lhe sempre umas dicas se o via atrapalhado. O Dr. Joaquim Mendes de Castro foi «um homem a quem o trabalho não cansou, o medo não silenciou e a liberdade e a coerência nunca abandonaram». Nos meus anos de Teologia, andava ele com outros biblistas, às voltas com a “Primeira tradução da Bíblia feita em Portugal com critérios científicos” a partir dos textos originais. Era editada, em fascículos, pela Editorial Universus. Mais tarde aparece, em volume, com o título de “Bíblia Monumental”. Descobrira, na Biblioteca de Lamego, um códice inédito da Bíblia em versão medieval. Deu-o à estampa com um comentário. Ficou conhecida como – “A Bíblia de Lamego”. Publicou, ainda, “Samuel Usque e o seu contributo para a versão portuguesa da Bíblia”, trabalho premiado pela Academia Portuguesa de História. Era um pregador muito requisitado, não pela voz que era frágil mas pela doutrina esplanada. Tinha o condão de animar os jovens que escreviam, em prosa ou em verso, nos jornais. Era muito amigo dos padres, ficava muito contente quando sabia que eram acompanhados por uma irmã e preocupava-se com o seu parco sustento. A sua débil saúde não o deixou voar mais alto mas não o impediu que vivesse 96 anos fecundos. Ao celebrar, no Céu, o centenário do seu nascimento (21/06/1920) aqui deixo, timidamente, um pouco da minha admiração grata que sinto por ele.” Quem, como eu, o conheceu no Porto estava longe de imaginar que o porte distinto mas discreto e a «voz frágil» daquele padre escondiam uma tão rica inteligência, um coração tão bondoso, um tão devotado “servo” da fé e da cultura. Uma palavra de parabéns para a diocese de Lamego.(9/12/2020)